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18.9.07

Do virtual ao real



Tenho uma penca de amigos na web com os quais eu falo quase todo dia. Rolando essa página um pouco mais para baixo, vocês poderão inclusive ver um vídeo que postei no YouTube em que rasgo minha seda pura para esses “quase irmãos”. Rimos juntos, trocamos figurinhas, reclamamos do trabalho, da vida, brigamos às vezes, confundimos sentimentos, acompanhamos as novelas amorosas uns dos outros, ensaiamos conselhos – tudo como deve ser numa verdadeira relação de amizade.
Há muito pouco tempo, as amizades virtuais eram vistas com certo preconceito. A neurose urbana e moderna aconselhava o “pé-atrás” para esse tipo de relacionamento. Dizia-se ser coisa de nerds, sujeitos solitários, infelizes e incapazes de fazer amigos no mundo desplugado. Ou então, tarados ou serial killers em potencial à espreita de uma próxima vítima desavisada. Evidentemente que tudo isso mostrou-se ser uma grande bullshit que ficou lá nos primórdios da internet. Hoje, os limites que marcavam as relações on e offline esvaeceram: amigos virtuais tornam-se cada vez mais reais; e os reais, em contrapartida, na roda-viva do dia-a-dia, vão se tornando virtuais por conta das despedidas, dos deslocamentos espaciais e temporais – não raro ausentes, offline, volto logo, ocupados ou mesmo bloqueados e ignorados...

Talvez o grande barato da internet seja proporcionar o encontro de almas semelhantes que, provavelmente, nunca se cruzariam pelos caminhos do real. Ou, ainda que os caminhos coincidissem, jamais teriam a oportunidade de se enxergar e se encontrar. Quem pode garantir que o cara sentado ao nosso lado no metrô também não leu os mesmos livros que a gente, não ouve os mesmos cd’s, não tem os mesmos ídolos? E se aquela gostosa do escritório em que trabalhamos e cujo nome nem mesmo sabemos (por força do hábito de só nos referirmos a ela como “aquela do rabão maravilhoso”) também não leu tudo de Saramago ou Nothomb? São coisas que só iremos descobrir nas comunidades do Orkut... E lá nessas comunidades, descobrimos atônitos que a gostosa do rabão maravilhoso tem um cérebro e uma alma para além do rabão maravilhoso... e que a gente foi um babaca de antolhos durante muito tempo...
A alusão aqui a Saramago e Nothomb não foi gratuita. Lembrei-me de um depoimento que me fez uma amiga de Orkut (ainda virtual) que adora esses autores, onde ela fala justamente sobre isso: a Daia é carioca da gema, mas mora na França há anos... o depoimento pode ser lido no meu perfil do Orkut, mas reproduzo aqui:

“A vida tem dessas coisas: a gente nasce, cresce, namora, casa, tudo na mesma cidade. Vai embora pra nunca mais voltar. Se instala em um país novo, começa tudo outra vez, conhece mais gente, o tempo passa, os filhos crescem... E quando menos se espera, graças à magia da informática, conhece alguém que sempre esteve lá, na mesma cidade que você, com quem você tem afinidades, que escreve super bem e que parece ter sido seu amigo desde sempre. O que dizer? O orkut e o destino consertaram o erro imenso que foi ter vivido tanto tempo tão perto sem ter te conhecido.
Um beijo, Edmilson! Você é genial!”


E tem também os e-mails, o MSN e afins que são grandes aliados para se manter acesa a chama da amizade no reino da virtualidade. Porque um amigo, virtual ou não, precisa mesmo é ser lembrado, precisa ver que o outro está ali ao alcance de uma mensagem, de um recado, de uma piada; precisa acreditar que um dia ainda vão conseguir marcar aquele tão planejado e ansiosamente esperado encontro... ainda que leve semanas, meses, anos para que isso aconteça.


Para um pequeno grupo de amigos virtuais isso não demorou tanto assim. No último fim de semana, alguns amigos que se conheceram através da comunidade orkutiana Ame e dê vexame, tiveram o prazer imenso e indescritível de se encontrar, se abraçar, se beijar, conversar, brincar, rir – enfim, sentir a presença física um do outro no “orkontro” que promovemos por ocasião do primeiro aniversário da citada comunidade. E foi bom demais!!!!!! Estou até agora em estado de graça! E o mais interessante é que - descontados os 10 minutos iniciais de comoção e embasbacamento diante da comprovação e ratificação da beleza dos amigos (o que se nos apresentava ali no real era exatamente como se imaginara a partir do virtual) - parecia que todos que ali estavam já se conheciam há muito tempo: não havia necessidade de apresentações, de cada um falar um pouco de si; tal era o grau de intimidade e cumplicidade que todos compartilhavam. O “orkontro” aconteceu aqui no Rio, mais exatamente em Paquetá, e teve a duração de um fim de semana inteiro. Mas veio gente de São Paulo, de Resende e de vários pontos dessa imensa cidade que é o Rio de Janeiro. Relações que até então estavam mediadas pela telinha tornaram-se mais consolidadas, mais estreitas... O presencial explicitando as afinidades que já sabíamos existirem desde sempre... Foi lindo demais!

















O fato é que, independentemente de ser um amigo de infância, de faculdade, de Orkut, de blog ou de MSN, quando é sincero, fiel e dedicado será sempre um amigo real.


Confiram alguns momentos do "orkontro" nos vídeos a seguir!



1.9.07

Por trás de uma porta verde, há um diabo na carne da gente gritando do mais profundo de nossa garganta



"O único cinema real é o cinema pornográfico."

Jean-Luc Godard




Eram os primeiros anos da década de 80. Eu estava na faixa dos 14 ou 15 anos. Bigode na cara já, cara de homem feito, carteirinha do colégio adulterada, lá fui eu me aventurar naquele poeirinha do subúrbio de Madureira. Lembro-me até hoje daquele dia. Foi como um ritual de iniciação: o primeiro filme pornô (muitos viriam depois). Eu ali, no meio de todos aqueles homens: uns suados vindos do trabalho; outros cheirando a loção pós-barba (família, esposas e filhos esquecidos por algumas horas na sacrossantidade do lar); as mariconas velhas à espreita de uma oportunidade com os mais excitados... e eu ali, me achando o máximo, me sentindo um homem como todos eles, efetuando meu rito de passagem. Aos olhos do menino habituado até então aos “catecismos” do Carlos Zéfiro, às revistinhas suecas de cores fortes e mal impressas e aos romances proibidos de Cassandra Rios, a visão daqueles paus e bocetas enormes naquela tela também enorme foi como o descortinar de uma nova dimensão. Lembro-me de ter ficado excitado durante toda a projeção do filme, a cueca ensopada por um misto de pré-sêmen e suor... Ao chegar em casa, as duas punhetas seguidas foram inevitáveis... O filme em questão era nada mais nada menos que Garganta Profunda.

É dito que o primeiro filme pornográfico foi La Bonne Auberge. Rodado na Paris de 1908, o filme mostrava prostitutas interpretando a si mesmas em cenas de sexo explícito. Mas foi somente na década de 70 que houve o verdadeiro boom do chamado cinema pornô.

O grande responsável por alavancar a porno-indústria foi Gerard Damiano que dirigiu, entre 1972 e 1973, os dois maiores clássicos do gênero: Garganta Profunda (Deep Throat) e O Diabo na Carne de Miss Jones (The Devil In Miss Jones).

Em O Diabo na Carne de Miss Jones, por exemplo, Justine Jones foi uma mulher que morreu virgem e, por conta disso, iria arder no fogo do inferno (nada mais justo, se pensarmos bem). Mas ela consegue a permissão do Diabo para voltar à Terra e experimentar tudo aquilo que havia renegado em vida - incluindo bananas e cobras vivas. É, sem dúvida alguma, um dos filmes que transformou o pornô em gênero cinematográfico legítimo – Garganta Profunda e Por Trás da Porta Verde sendo os outros dois que eu colocaria na lista. Georgina Spelvin, a Miss Jones, apesar de um tanto passada (à beira dos quarenta anos, na época) convence como a solteirona virgem suicida que se converte, por artes do capeta, em deusa da luxúria. E a bela trilha sonora de autoria de Alden Shuman foi utilizada em comerciais e até em telenovelas da Globo.

Já Linda, de Deep Throat (Linda Lovelace interpreta a si mesma no filme), descobre que não atinge o orgasmo porque tem o clitóris na garganta, o que leva a moça a enveredar pelo que os antropólogos costumam chamar de "cultura oral". Garganta Profunda é talvez o filme pornográfico de maior sucesso de todos os tempos. Gravado em seis dias no mês de janeiro de 1972, em Miami Beach, escrito e dirigido por Gerard Damiano e estrelado por Linda Lovelace, teve um custo irrisório de 24 mil dólares financiados pela família mafiosa Peraino. Ele estreou três meses depois em abril de 1972 num cinema da Rua 42, em Manhattan, Nova York. Arrecadou só nos EUA cerca de 20 milhões de dólares, no mundo inteiro esse valor chega a 600 milhões. Por conta desse estrondoso sucesso, várias celebridades deram atenção ao polêmico filme: o cineasta Mike Nichols, o escritor Truman Capote, o ator Warren Beatty, o cantor Frank Sinatra, entre outros. Ele foi descrito pela revista Variety como o Ben-Hur do pornô e como O Poderoso Chefão do cinema erótico pelo presidente da Paramount, Frank Yablans. Garganta Profunda mudou a maneira de ver o cinema pornô, que a partir daí virou uma forma legítima de entretenimento.

Por Trás da Porta Verde (Behind The Green Door) é considerado o primeiro filme erótico para mulher que existiu. A personagem principal do filme é vivida pela loira Marilyn Chambers, que é seqüestrada e levada a um estranho clube de porta verde no qual ocorrem muitas depravações. O filme dá um show de direção e a história começa a ser conduzida de forma brilhante pela visão da mulher, na qual a antológica cena da orgia seria copiada de forma muito clara no filme De Olhos Bem Fechados, de Stanley Kubrick. Uma referência muito bem escolhida e acertada pelo sempre perfeccionista Kubrick.

É claro que as três histórias são inverossímeis, diria até viajantes demais, mas servem infelizmente de pretexto para toda a putaria mal acabada que rolaria a partir de então.

Mas o que importa aqui é salientar que esses filmes tinham histórias... e histórias até bem interessantes.

Lá pelos meados dos anos 80, entretanto, a filmografia pornô começa a abandonar os roteiros mais elaborados e parte pro "vamos-ver" da forma mais diretamente nua e crua possível (inevitável o trocadilho). Inaugurava-se aí a fase fast-food do cinema pornô.

Chegariam então os anos 90 e o século XXI. E, com o advento das locadoras de vídeo, da internet e da tv a cabo, tudo mudaria mais uma vez. Enredos, roteiros e histórias então cedem lugar a cenas estanques de poucos minutos, às vezes segundos. Envereda-se pelo filão de uma concepção funcionalista que acredita que a duração dos filmes não precisa ultrapassar o tempo da punheta mais afobada. E como se não bastassem os atores e atrizes (eu disse atores e atrizes?) de hoje em dia siliconizados, artificiais, construídos e depilados (o que são aqueles caras de saco raspado, meu Deus?!), o erotismo e a insinuação caem por terra de maneira broxante, e a gente experimenta a nostalgia de um tempo de inocência: aquele dos filmes de Gerard Damiano. Sim, de inocência... por mais paradoxal que possa parecer essa afirmação. Inocência nos olhos do menino querendo parecer homem naquele poeirinha de subúrbio... e até mesmo dos marmanjos que ali se encontravam. Naquela época, estávamos longe de imaginar que os atuais reality show, os programas de auditório e o entretenimento fácil e rasteiro que pululam na tv acabariam de forma tão infame com o efeito da surpresa e da sedução dos pornôs de outrora.

Pois se há um gênero merecedor de uma página especial e à parte, devido à polêmica que causa, este é o ramo do cinema pornô, tido muitas vezes como um cinema bandido, periférico e ordinário. Desmascarar este falso mito é mostrar que fazer cinema é fazer arte, independente do gênero e conteúdo. Há que se criticarem evidentemente os filmes que simplesmente exploram a sensualidade e recordar os que a mostravam de forma inteligente e com suas próprias razões de exibi-la. Pois não apenas os filmes devem ser inteligentes, as pessoas que a eles assistem também devem. É preciso ter olhos educados e exigentes, além de saber como apreciar este tipo de arte. A melhor maneira de se fazer isso é se desfazer de preconceitos babacas e desse sentimento de culpa que a sociedade tem em relação à questão sexual. Valores arcaicos que aliam sensualidade e sexualidade a algo impuro já deviam estar superados neste início de milênio. O erotismo sempre esteve ligado ao cinema de forma mais ou menos diluída. Esta junção de cinema e erotismo, com o passar do tempo, foi atingindo uma maior expressão, ainda que assumindo um falso caráter pecaminoso, buscando soluções inteligentes de criticar a imposição severa da censura. Devemos lembrar do diretor Russ Meyer, da década de 60, que soube aproveitar e criticar este "sexo culposo". Em seus filmes, as mulheres se faziam de puras para excitar o objeto de desejo, o que ocasionava um singelo estupro. Foi nos seus filmes, aliás, que surgiu uma das mulheres que se tornaria um ícone da época: a ruivíssima Uschi Digart, que estaria presente em várias capas de revistas famosas depois. Uma forma inteligente de que o diretor se utilizava para mostrar que a mulher, satisfazendo seus desejos, ainda assim não era culpada pelo fato ocorrido. A mulher pura querendo acabar com a repressão de seus impulsos. Bem, eu poderia também citar clássicos como A Bela da Tarde, de Luis Buñuel, em que Catherine Deneuve é Séverine - jovem rica e infeliz que procura um discreto bordel para realizar suas fantasias sexuais e conseguir o prazer que seu marido não consegue lhe dar. Ou mesmo À Procura de Mr. Goodbar , dirigido por Richard Brooks, em que a atriz principal Diane Keaton faz o papel de Theresa, uma mulher reprimida sexualmente que de dia dá aulas como professora de crianças surdas e, à noite, procura o prazer nos braços de homens desconhecidos. O talento de Diane Keaton mantém nossa atenção sobre o filme que foi indicado ao Oscar em 1978. O filme marcou também o primeiro trabalho substancial de Richard Gere e de Tom Berenger . Eram filmes ainda tímidos, mas importantes por chocar de maneira sutil e sensual.

Só nos resta a nós - os punheteiros "deslocados" e saudosistas - que gostaríamos de ver esta volta ao cinema pornô de qualidade, exigir cenas inteligentes, roteiros elaborados que justifiquem o erotismo em tela. Esperar que sejam mais bem selecionados os atores e as atrizes. E ver estes filmes com olhos apropriados. E pedir que, nos filmes pornôs atuais, as pessoas não façam apenas sexo, mas sim copiem, se precisar, a forma dos clássicos antigos nos quais as pessoas faziam amor.

Baixei nos emules da vida esses três clássicos. Foi muito emocionante assistir mais uma vez a esses filmes que povoaram minha imaginação de garoto nos momentos solitários. Obviamente que a excitação não foi nem um décimo da que experimentei anos atrás. Se o pau subiu, nem percebi. Donde concluo que eu também preciso resgatar a inocência de antes... Rever estes filmes trouxe uma nostalgia de mim mesmo...


Um presentinho para os leitores deste blog: a trilha sonora do filme O Diabo na Carne de Miss Jones, composta por Alden Shuman. Clique nos nomes das músicas para efetuar o download.


01. In the Beginning
02. Hellcat
03. I'm Comin' Home (muita linda, talvez a mais famosa)
04. The Teacher
05. Ladies in Love
06. Love Lesson
07. Beauty and the Beast
08. Walk With the Devil
09. Trio in the Round
10. Miss Jones Comes Home (reprise da 3ª música, também muito linda)
11. At the End
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