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17.1.07

Vou-me embora pra Floripa

Lá sou amigo do Sílvio e da Bel
Lá tenho a bebedeira que quero

No copo que escolherei...



Hehehehehe....

O blog sofrerá uma pausa de uma semana. Vou conhecer novas terras e novas gentes. Mais material e vivências que, com certeza, serão compartilhados aqui com vocês, caros leitores.
Aos que me seguem aqui cotidianamente (os que o declaram e os que não), deixo-lhes o tempo para refletirem sobre o que já escrevi até aqui: para alguns, mensagens de amor e carinho; para outros, recados diretos e na cara; para outros ainda, palavras de difícil compreensão (números são números, letras são letras); e para outros enfim, matéria para literatura de terceira.
Assim é o Ed: para gregos e troianos!

Oh! tristeza me desculpe
Estou de malas prontas

Hoje a poesia

Veio ao meu encontro

Já raiou o dia

Vamos viajar.

Vamos indo de carona

Na garupa leve

Do vento macio

Que vem caminhando

Desde muito longe

Lá do fim do mar.

(...)

Mas pode ficar tranqüila,

Minha poesia,

Pois nós voltaremos

Numa estrela guia

Num clarão de lua

Quando serenar.

Ou talvez até quem sabe,

Nós só voltaremos

No cavalo baio

No alazão da noite

Cujo o nome é raio,

Raio de luar.

(João de Aquino / Paulo César Pinheiro)


Prenant la route qui mène
A mes rêves d'enfant
Sur des îles lointaines
Où rien n'est important
Que de vivre
(...)
Je fuirais laissant là mon passé
Sans aucun remords
Sans bagage et le coeur libéré
En chantant très fort

Emmenez-moi au bout de la terre
Emmenez-moi au pays des merveilles
Il me semble que la misère
Serait moins pénible au soleil...

(Charles Aznavour)

Até a volta!

14.1.07

É isso aí... mais Ana Carolina...



Eu, particularmente, não gosto muito de versões de músicas estrangeiras. Salvo raras exceções (“Fascinação”, com a Elis e “Não chore mais”, com o Gil), na maioria das vezes, a versão fica muito aquém do original. Mas aqui, Ana Carolina conseguiu algo fenomenal: manter o mesmo clima da música de Damien Rice.
Nove em cada dez pessoas que ouvem e gostam do irlandês Damien Rice o conheceram através do filme Closer: Perto Demais. Quando “The Blower’s Daughter” começa a tocar, logo no início do filme, acompanhando os passos de Natalie Portman e Jude Law, a sensação transmitida pelo conjunto - música, clima, paisagem, personagens - pode ser resumida em uma palavra: encantador!
O filme é sexy e sofisticado, mas esses adjetivos são utilizados da maneira mais perigosa possível. Há mesmo uma turma enfurecida com o filme de Mike Nichols, especialmente as adolescentes que acreditam naquele grande amor para a vida toda (bom, não só as adolescentes, né?). Mas Closer é a mais pura verdade, sem floreios nem firulas e na sua pior faceta. O filme atesta o papel cada vez menor do afeto nas relações "amorosas" contemporâneas. E o faz com tamanha perspicácia. Em Closer as palavras são como tratores e as pessoas as usam para atropelar umas as outras. Não há sabão que limpe a boca suja de Closer. E a música encanta e comove mesmo...

The Blowers Daughter

(Damien Rice)


And so it is
Just like you said it would be
Life goes easy on me
Most of the time
And so it is
The shorter story
No love, no glory
No hero in her sky


I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes...


And so it is
Just like you said it should be
We'll both forget the breeze
Most of the time
And so it is
The colder water
The blower's daughter
The pupil in denial


I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes of you
I can't take my eyes...


Did I say that I loathe you?

Did I say that I want to

Leave it all behind?


I can't take my mind of you

I can't take my mind of you

I can't take my mind of you

I can't take my mind of you

I can't take my mind of you

I can't take my mind...

My mind...my mind...

'Til I find somebody new


Mas, como eu falei, Ana Carolina consegue manter esse mesmo clima da canção original (e, por conseguinte, do filme também). Coisa que só pessoas iluminadas como ela são capazes de realizar. Pois o que você imagina que irá acontecer quando você se apaixonar? O que espera ganhar? Você quer que a pessoa torne-se parte de você? Que a companhia dela seja o bastante? E se, por acaso, um de vocês desistir ou mudar de opinião? Você estaria disposto a arrasar a pessoa que te arrastou para sua ilusão de como a felicidade deveria ser, apenas para tentar ver se você consegue ser só um pouquinho mais feliz com isso? Isso é correto? E quando contamos a verdade, somos mais heróicos do que quando mentimos, mesmo que a verdade vá arrasar vidas e corações para sempre? A resposta, se é que há uma, é que no momento em que pararmos de idealizar romances (que são uma distração, mas não são amor de verdade), poderemos realmente desfrutar de quem está ao nosso lado, realmente descobrir as pessoas com quem vivemos e, portanto, nossos relacionamentos...

E, para arrematar tudo isso, ainda tem a participação pra lá de especial de Seu Jorge. É bom demais!!!!





É Isso Aí
(Damien Rice / vers.: Ana Carolina)

É isso aí
Como a gente achou que ia ser
A vida tão simples é boa
Quase sempre
É isso aí
Os passos vão pelas ruas
Ninguém reparou na lua
A vida sempre continua

Eu não sei parar de te olhar
Eu não sei parar de te olhar
Não vou parar de te olhar
Eu não me canso de olhar
Não sei parar
De te olhar

É isso aí
Há quem acredite em milagres
Há quem cometa maldades
Há quem não saiba dizer a verdade

É isso aí
Um vendedor de flores
Ensinar seus filhos a escolher seus amores

Eu não sei parar de te olhar
Eu não sei parar de te olhar
Não vou parar de te olhar
Eu não me canso de olhar
Não vou parar de te olhar

13.1.07

É mágoa

(Ana Carolina)

É mágoa
Já vou dizendo de antemão
Se eu encontrar com você
Tô com três pedras na mão
Eu só queria distância da nossa distância
Saí por aí procurando uma contramão
Acabei chegando na sua rua
Na dúvida qual era a sua janela
Lembrei que era pra cada um ficar na sua
Mas é que até a minha solidão tava na dela
Atirei uma pedra na sua janela
E logo correndo me arrependi
Foi o medo de te acertar
Mas era pra te acertar
E disso eu quase me esqueci
Atirei outra pedra na sua janela
Uma que não fez o menor ruído
Não quebrou, não rachou, não deu em nada
E eu pensei: talvez você tenha me esquecido
Eu só não consegui foi te acertar o coração
Porque eu já era o alvo de tanto que eu tinha sofrido
Aí nem precisava mais de pedra
Minha raiva quase transpassa a espessura do seu vidro
É mágoa
O que eu choro é água com sal
Se der um vento é maremoto
Se eu for embora não sou mais eu
Água de torneira não volta
E eu vou embora
Adeus



O que eu choro é água com sal
Se der um vento é maremoto...



11.1.07

Discurso: 100... Prática: 0



“Ainda não tinha aprendido o quanto a natureza humana é contraditória; não sabia quanta hipocrisia existe nas pessoas sinceras, quanta baixeza existe nos nobres de espírito, nem quanta bondade existe nos maus.”

(William Somerset Maugham)


Hipocrisia é o ato de fingir ter crenças, virtudes e sentimentos que a pessoa na verdade não possui. A palavra deriva do latim hypocrisis e do grego hupokrisis, ambos significando representar ou fingir.



Na boa, estou cansado dessas pessoas com um discursozinho todo lindinho, arrumadinho, magnificamente libertário, politicamente correto... mas que, na prática, são uns escrotos reacionários do cacete.

" Ôôô , ôô
Gente estúpida

Ôôô , ôô

Gente hipócrita"

O que é mais foda é que parece que esses escrotos acabam acreditando em seus discursozinhos falsos. São seduzidos por suas próprias palavras, na mesma medida em que tentam seduzir seus interlocutores. São uma coisa e querem parecer outra. E se perdem de si mesmos...

"Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.

O dominó que vesti era errado.

Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.

Quando quis tirar a máscara,

Estava pegada à cara. "


Há uma dissociação enorme entre o ser e o parecer. Jean-Jacques Rousseau teceu essa argumentação no Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens, no início da segunda metade do século XVIII. É essa dissociação entre o ser e o parecer que permitiu ao filósofo um olhar crítico sobre a modernidade no seu alvorecer. Explicando um pouco: se tivermos como referência as sociedades tradicionais e a própria cultura ocidental até o início da modernidade, percebemos que as pessoas tinham lugares muito definidos na cadeia do ser; o que elas deveriam fazer e, inclusive, falar, estava dado. A dissociação entre o que se é e o que se aparenta ser simplesmente não se punha, não tinha sentido e, com ela, também não tinha sentido a fissura entre o dizer e o fazer e a fissura entre o ser e o fazer. Essa fissura, no entender de Rousseau, só fez alargar-se. Talvez tenhamos chegado ao seu ponto culminante, pois aquilo que algumas pessoas são - quando sabem quem são - escondem, diminuem, espezinham; só é permitida a emergência do parecer, das máscaras, daquilo que Jung chama de persona. As máscaras lhes permitem realizar no social um pequeno fragmento do seu ser - o restante permanece atrofiado, reprimido. Não sei se odeio ou se, na verdade, tenho pena desses falsários das palavras e das relações...


Histoire de faussaires

Se découpant sur champ d'azur
La ferme était fausse bien sûr,
Et le chaume servant de toit
Synthétique comme il se doit.

Au bout d'une allée de faux buis,
On apercevait un faux puits
Du fond duquel la vérité
N'avait jamais dû remonter.

Et la maîtresse de céans
Dans un habit, ma foi, seyant
De fermière de comédie
A ma rencontre descendit,
Et mon petit bouquet, soudain,
Parut terne dans ce jardin
Près des massifs de fausses fleurs
Offrant les plus vives couleurs.

Ayant foulé le faux gazon,
Je la suivis dans la maison
Où brillait sans se consumer
Un genre de feu sans fumée.

Face au faux buffet Henri deux,
Alignés sur les rayons de
La bibliothèque en faux bois,
Faux bouquins achetés au poids.

Faux Aubusson, fausses armures,
Faux tableaux de maîtres au mur,
Fausses perles et faux bijoux
Faux grains de beauté sur les joues,
Faux ongles au bout des menottes,
Piano jouant des fausses notes
Avec des touches ne devant
Pas leur ivoire aux éléphants.

Aux lueurs des fausses chandelles
Enlevant ses fausses dentelles,
Elle a dit, mais ce n'était pas
Sûr, tu es mon premier faux pas.

Fausse vierge, fausse pudeur,
Fausse fièvre, simulateurs,
Ces anges artificiels
Venus d'un faux septième ciel.

La seule chose un peu sincère
Dans cette histoire de faussaire
Et contre laquelle il ne faut
Peut-être pas s'inscrire en faux,
C'est mon penchant pour elle et mon
Gros point du côté du poumon
Quand amoureuse elle tomba
D'un vrai marquis de Carabas.

En l'occurrence Cupidon
Se conduisit en faux-jeton,
En véritable faux témoin,
Et Vénus aussi, néanmoins
Ce serait sans doute mentir
Par omission de ne pas dire
Que je leur dois quand même une heure
Authentique de vrai bonheur.

(Georges Brassens)

10.1.07

Mono-logar

Vou me permitir, para o desespero dos gramáticos, reinventar a etimologia de monologar.



Não mais de mono ("único"; "sozinho") + logos ("palavra"; "discurso"). Modernamente, meu chiste etimológico vai considerar logar como o neologismo verbal a partir de login ("conectar", na linguagem da informática). Assim, logamos quotidianamente sós e aqui na rede trasmutamos o "mono" em "pluri", "multi". Mas, ironicamente, esse reagrupamento virtual da diáspora só tende a deixar mais evidente e ululante o isolamento do real. "Logamos" para buscar aqui na rede aquilo a que fugimos fora dela. Estamos nos encastelando em nossos quartos, escritórios e salas diante da telinha e o mundo lá fora parece se fazer mais virtual que o cibernético. Perdi uma amiga da minha lista do orkut. Ela abandonou o site de relacionamento com a seguinte justificativa: "O Orkut aproxima os que estão longe e afasta os que estão próximos". Talvez um pouco categoricamente radical sua assertiva, mas nem por isso de toda irrefutável. Perdemos a capacidade do abraço e do olho no olho. O toque assusta e incomoda. Assistimos atônitos e impotentes ao retorno à tribalidade e ao bairrismo. E isso em plena era da globalização! E talvez exatamente por conta dessa globalização... E isso é grave!
Fica, disso tudo, aquela sensação de que algo não foi dito, não foi sentido, não atualizado (no sentido de "tornar ato"), não foi concretizado. E assim, mais tarde, já velhinhos (ou talvez nem tão velhinhos assim) a gente vai perceber o quanto perdemos por conta desse nosso medo arraigado de encarar o outro, de abraçá-lo, beijá-lo, tocá-lo, sentar para escutá-lo, dizer-lhe de boca e pulmão cheios: "Porra! Como é bom poder ter você aqui comigo!!!" Mas aí talvez será tarde... E só nos restará cantar as palavras do Ivan Lins e do Vitor Martins:

Quando brotarem as flores,
Quando crescerem as matas,
Quando colherem os frutos,
Digam o gosto pra mim...

Digam o gosto pra mim...

Minha irmã me ligou há algum tempo no celular. Depois que coloquei a tal da internet sem limites, o telefone fixo aqui de casa não pára livre, vivo plugado na internet... Sim, minha conexão ainda é discada!!!!!!
Ela me ligou, a voz embargada, puta da vida e me disse as palavras mais duras que já ouvi em toda minha vida talvez. Perguntou-me como posso me esquecer de ir visitá-la, morando há apenas quinze minutos de ônibus. Como posso, em um ano de vida da minha sobrinha e afilhada, só ter ido vê-la 3 ou 4 vezes. Tentei argumentar que pouco tenho saído de casa depois da morte do meu grande amigo-irmão há alguns meses atrás. Mas, no fundo, eu sei que estava mentindo não só pra ela, mas pra mim mesmo. Aí ela perguntou por que ela não consegue falar comigo pelo telefone fixo e por que eu não ligo pra ela, já que pra ela é mais complicado por questões financeiras mesmo. Foi aí que a coisa fudeu de vez: disse-lhe que passava quase o dia todo na internet, no orkut e no msn, conversando com amigos. Senti que, do outro lado, o mundo dela pareceu desabar. E só então percebi a canalhice da minha atitude. Ela desligou dizendo que qdo eu achasse um tempinho entre tanta atividade social que eu fosse lá na minha antiga casa, nem tanto por ela, mas para ver minha sobrinha-afilhada crescer. E desligou chorosa. Fiquei mal pra caralho!!!! Veio-me imediatamente à mente aquela cena do filme Hair em que aquela negra canta lindamente uma canção em pleno Central Park coberto de neve, questinando o marido que a abandonou com o filho nos braços para ir se juntar a um grupo de hippies:

How can people be so heartless
How can people be so cruel
Easy to be hard
Easy to be cold

How can people have no feelings
How can they ignore their friends
Easy to be proud
Easy to say no

And especially people
Who care about strangers
Who care about evil
And social injustice
Do you only
Care about the bleeding crowd?
How about a needing friend?
I need a friend

How can people be so heartless
You know I'm hung up on you
Easy to give in
Easy to help out

And especially people
Who care about strangers
Who say they care about social injustice
Do you only
Care about the bleeding crowd
How about a needing friend?
I need a friend

How can people have no feelings
How can they ignore their friends
Easy to be hard
Easy to be cold
Easy to be proud
Easy to say no


O que me doeu não foram as palavras duras da minha irmã, mas ter me dado conta que ela está coberta de razão...

8.1.07

Confesso que vivi...



“Meu caminho junta-se ao caminho de todos. E em seguida vejo que desde o sul da solidão fui para o norte que é o povo, o povo ao qual minha humilde poesia quisera servir de espada e de lenço para secar o suor de suas grandes dores e para dar-lhes uma arma na luta pelo pão.”
Pablo Neruda





Em 12 de julho de 1904 — há mais de cem anos portanto — nasce Neftali Ricardo Reys Basoalto. No pequeno lugarejo em que nasceu, Parral, a 340 quilômetros de Santiago, ou em qualquer outro lugar, os nascimentos fazem parte do cotidiano. Nada há de especial. Seus pais são personagens comuns: ele é José del Carmen Reys Morales, maquinista de um trem lastreiro; ela, Rosa Basoalto Reys, professora, morta de tuberculose um mês depois de o menino nascer. Outra personagem entra no enredo de Neftali — Trinidad Candia Marverde — a segunda esposa de seu pai a quem ele acha incrível ter de chamar de madrasta já que ela é o anjo tutelar de sua infância, diligente e doce, com senso de humor camponês, e a bondade ativa e infatigável. Rodolfo e Laura — seus irmãos, filhos de seu pai e de Trinidad — são mais dois personagens do enredo nerudiano.



Nos primeiros cinco anos, Neftali corre sua infância pelas veredas de Parral ao sabor da chuva, do vento e do frio. Ternos anos, pouco registrados pela memória do garoto. Mudou-se com a família para Temuco — cidade pioneira, dessas sem passado, com grandes lojas de ferragem ostentando desenhos dos produtos à venda porque muitos compradores são índios e não sabem ler. Aliás, os araucanos, que lá vivem, são acossados primeiro pelos espanhóis; depois, pelos próprios chilenos. Neste mesmo ano, 1910, Neftali é matriculado no Liceu, cuja diretora, mais tarde, seria a escritora Gabriela Mistral — Prêmio Nobel de Literatura em 1945. Gabriela Mistral e seu tio Orlando Masson, poeta e fundador do Diário de Temuco, estimulam suas incursões poéticas.


“Talvez não tenha vivido em mim mesmo, talvez tenha vivido a vida dos outros.
Do que deixei escrito nestas páginas se desprenderão sempre – como nos arvoredos de outono e como no tempo das vinhas – as folhas amarelas que vão morrer e as uvas que reviverão no vinho sagrado.
Minha vida é uma vida feita de todas as vidas: as vidas do poeta.”


Depois dos anos de Liceu, o poeta vai para faculdade em Santiago do Chile e incorre em novas descobertas e desconhecimentos. Assume a timidez inimaginável para o autor dos Cantos Gerais:


“A timidez é uma condição estranha da alma, uma categoria e uma dimensão que se abre para a solidão. Também é um sofrimento inseparável, como se a gente tivesse duas epidermes e a segunda pele interior se irritasse e se contraísse diante da vida. Entre as estruturações do homem, esta qualidade ou este defeito são parte do amálgama que vai fundamentando, numa longa circunstância, a perpetuidade do ser.”



A nomeação de Pablo Neruda para ser cônsul do Chile em Rangum inicia uma nova fase na vida do poeta que conhece um novo mundo nos lugares remotos que vive e passa a ter uma percepção mais ampla do homem:


“O poeta não pode temer o povo. Pareceu-me que a vida fazia uma advertência e me ensinava para sempre uma lição: a lição da honra oculta, da fraternidade que não conhecemos e da beleza que floresce na escuridão.”



Sua relação com Federico Garcia Lorca e com a Espanha estão sacramentadas no caderno “Espanha no coração”. O poeta vive a guerra civil espanhola e tais vivências influenciam de forma marcante sua literatura e o seu ingresso no Partido Comunista, seu encontro com a União Soviética, os escritores em ebulição em Moscou, a esperança de que o grande continente alçasse o grande vôo de uma nova verdade. “A revolução é a vida e os preceitos buscam seu próprio túmulo.” Neruda sente necessidade de escrever para os seus semelhantes, no caminho do humanismo enraizado nas aspirações do ser humano. Assim começou a escrever os Cantos Gerais.



Neruda nunca esqueceu suas raízes, sempre esteve ligado aos acontecimentos políticos e sociais de sua pátria. Aliás, em sua poesia podemos observar sempre a alusão às raízes, desde as tenras da infância nos bosques chilenos aos alicerces de convicções que nosso poeta construiu e floresceu em seus poemas.

Que bom idioma o meu, que boa língua herdamos dos conquistadores torvos... Estes andavam a passos largos pelas tremendas cordilheiras, pelas Américas encrespadas, buscando batatas, feijõezinhos, tabaco negro, ouro, milho, ovos fritos, com aquele apetite voraz que nunca mais se viu no mundo... Tragavam tudo: religiões, pirâmides, tribos, idolatrias iguais as que eles traziam em suas grandes bolsas... Por onde passavam a terra ficava arrasada... Mas caíam das botas dos bárbaros, das barbas, dos elmos, das ferraduras, como pedrinhas, as palavras luminosas que permaneceram aqui resplandecentes... o idioma. Saímos perdendo... Saímos ganhando... Levaram o ouro e nos deixaram o ouro... Levaram tudo e nos deixaram tudo... Deixaram-nos as palavras.”



O último capítulo é sobre a vida e a morte de Salvador Allende, primeiro marxista eleito presidente da República na América Latina em 1970, morto durante o golpe que do depôs em 11 de setembro de 1973. Neruda escreveu-o poucos dias após aos fatos que culminaram na morte do governante e morreu no mesmo mês, em 23 de setembro de 1973.



Pablo Neruda, pseudônimo criado por Neftali Ricardo Reyes Basoalto ainda na juventude para esconder a autoria dos poemas de seu pai, viajou o mundo inteiro e divulgou sua poesia e seus ideais humanísticos pelos diversos povos e culturas.



Como o próprio poeta afirmou em sua autobiografia: “...a história é escrita pelos vencedores ou pelos que desfrutaram da vitória.” Pablo Neruda é um vitorioso, venceu os preconceitos e as tantas perseguições políticas e criou uma obra literária lida no mundo inteiro - uma leitura obrigatória para toda a humanidade.

"Em minha pátria, prendem-se mineiros. E os soldados mandam mais que os juízes."

"Mudou a sociedade, mudaram a época e a moda. As fábricas transformaram-se em deusas. Os deuses associados produziram salsichas, armamentos, automóveis. As guerras santas desta época foram as do petróleo. Os hereges que não se prosternarem ante os pagodes petrolíferos foram exterminados, não pela cimitarra ardente, nem pela cruz cheia de pregos, mas pelos golpes da polícia, pela tortura e pelas prisões."

"Coube a mim sofrer e lutar, amar e cantar: couberam-me na partilha do mundo o triunfo e a derrota, provei o gosto do pão e o do sangue. Que mais quer um poeta?"

"E todas as alternativas, desde o pranto até os beijos, desde a solidão até o povo, perduram em minha poesia, atuam nela porque vivi para minha poesia e minha poesia sustentou minhas lutas."

"E se muitos prêmios alcancei, prêmios fugazes como mariposas de pólen fugitivo, alcancei um prêmio maior, um prêmio que muitos desdenham mas que é na realidade inatingível para muitos. Cheguei através de uma dura lição de estética e de busca, através de labirintos da palavra escrita, a ser poeta do meu povo. Meu prêmio é esse e não os livros e os poemas traduzidos ou os livros escritos para descrever ou dissecar minhas palavras."

"A poesia é sempre um ato de paz. O poeta nasce da paz como o pão nasce da farinha."

"O poeta não é um 'pequeno deus'. Não, não é um 'pequeno deus'. Não está assinalado por um destino cabalístico superior ao dos que exercem outros misteres ou ofícios. Expressei amiúde que o melhor poeta é o homem que nos entrega o pão de cada dia: o padeiro mais próximo, que não se acredita um deus. Ele cumpre sua majestosa e humilde tarefa de amassar, enfornar, cozer e estragar o pão de cada dia, com uma obrigação comunitária."


"E se o poeta chega a alcançar essa singela consciência, poderá também a singela consciência converter-se em parte de um colossal artesanato, de uma construção simples ou complicada, que é a construção da sociedade, a transformação das condições que rodeiam o homem, a entrega da mercadoria: pão, verdade, vinho, sonhos."

"... o poeta tomará parte no suor, no pão, no vinho, no sonho de toda a humanidade."

"Penso com alegria que tudo o que vivi e escrevi serviu para aproximar-nos. O primeiro dever do humanista e a tarefa fundamental da inteligência é assegurar o conhecimento e o entendimento entre todos os homens. Vale muito ter lutado e cantado, vale muito ter vivido se o amor me acompanha."

" Nunca entendi a luta senão para que esta termine."


(Fragmento dos livros Confesso que vivi e Para nascer nasci, de Pablo Neruda.Ed. Difel, 1977)




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Sim, confesso que vivi. Confesso, outrossim, que morri. E assim vou morrendo para a vida e revivendo da morte. Quotidianamente. Didaticamente. E estabeleço minha aprendizagem nesse eterno ir e vir. Do funeral ao luto de mim mesmo, do luto de mim mesmo à ressurreição, toda a fugacidade do momento se expande e se agiganta consoante meus movimentos na direção da minha gnose e de meus mistérios. Sou Perséfone masculinizada ou Hades feminilizado. Sou morte e vida. Severa e severina. Carrego em meu ser a morte e a vida. Entendo-me mais que barro; mas lamaçal, lodo, mangue – onde toda a biodiversidade reina de par com a podridão dos restos mortais dos homens que aí se aventuram em busca de seus caranguejos. Homens, caranguejos, poetas e lama – tudo oriundo da mesma matéria líquida. Tudo destinado à mesma certeza sólida dos solos. À mesma certeza etérea do esquecimento.
Sim, confesso que vivi. Confesso, outrossim, que morri...

(Edmilson Borret)

7.1.07

Alteridades...



Olhar o defeito do outro


A mulher olhou através sua janela, apontou para o quintal da vizinha e disse ao marido:

- Há dias venho observando como é encardida a roupa da vizinha. Eu teria vergonha de pendurar no varal uma roupa tão mal lavada. Isso é relaxamento, um desleixo... Na verdade, acho que é preguiça.

O tempo passava... e, cada vez que ela voltava a observar, as roupas tinham um aspecto pior. Certo dia, uma surpresa! Ao reparar nas roupas da vizinha, ficou abismada. Estavam brancas, limpinhas, as cores vivas.

- Criou vergonha, disse ela. Perdeu a preguiça e esfregou mais, ou então trocou a marca do sabão.

- Nada disso, replicou o marido. Fui eu que lavei.

- Lavou a roupa da vizinha?

- Não, mulher, lavei o vidro da janela. Era ele que estava encardido.


(Desconheço o autor)




Não se vê aquilo que não está no olhar. Ver não é “fenômeno ótico” ou biológico. Faz parte da maneira como se codifica e decodifica o mundo que nos circunda. Ver é codificar e decodificar. É, antes de tudo, maneira de interpretar, de dar sentido, de criar e reconhecer conexões e mediações entre instâncias óticas. Olhar é “ouvir” mediações e instaurar paralelos, identidade/diferença; é identificar nosso “cheiro” e garantir territórios; é “apalpar” o conhecido e se espantar com o outro, podendo, assim, vê-lo como outro; é “degustar”, com horror ou prazer, alteridades; é vivenciar como a única realidade, ou a realidade privilegiada, o real criado pelo social.
O “espanto” ao ver o estranho, o não sociabilizado, o “fora do costume”, nos leva, labirinticamente, à idéia de “educação dos sentidos”. Nesse século visual, o olhar conquistou seu lugar e, ao mesmo tempo, foi desvendado. Não se vê como os animais: vê-se aquilo que determinada sociedade instaura como instância visível, seus possíveis, impossíveis e variantes, as formas, seu movimento esperado ou a dialética entre essas mesmas dinâmicas. Até mesmo ver além dos limites acontece nas virtualidades vivas das redes ficcionais da práxis. O encontro com o desconhecido, como a garrafa de coca-cola no filme “Os Deuses Devem Estar Loucos”, ou os encontros dos europeus com “outros povos” nos faz recodificar, dando ao “caos” os significados e as redes simbólicas de sentido e segurança, “esquecendo” seu nada-para-nós. O olhar não suporta o nada: sem reconhecimento não há o ver; sem um projetar profundo, que é uma maneira de não ver, não conseguimos ver.
Todo olhar é olhar histórico. Ele não é uma função, mas um desdobrar e um projetar interioridades sociais, sendo instaurado como algo a ser conhecido ou reconhecendo esse mesmo conhecido. Principalmente porque sua instauração se dá dentro de redes culturais e seu exercício é sempre “proposta” dessas mesmas redes: não vemos senão essas “grades” e suas projeções.A partir desse fundamento, ver é sempre ver um mundo codificado, logo, ver é processo contínuo e profundo de codificação, decodificação e recodificação. A “realidade” não é algo dado, mas estrutura simbólica instituída sócio-historicamente. Tanto a codificação quanto a decodificação são processos indispensáveis “à existência das práxis sociais que conhecemos”. Sem essas “operações” seria impossível manter a estabilidade da antroposfera que nos permite reconhecer o outro, se reconhecer e reconhecer um mundo que nos cerca com suas funções, necessidades e valores.
Vendo, podemos instaurar as mediações necessárias ao entendimento do social como um todo. Mas esse ver apresenta-se como um “ouvir”: as mediações não são vistas, mas feitas sem se ver, fora do mundo das formas. Os nexos são impalpáveis, pertencendo mais ao “universo auditivo” que ao escultural do visível. Não vemos a relação entre as coisas a não ser quando se tornam visíveis. O olho lê sem ver, reconhecendo a possibilidade entre as coisas e sua normalidade. Com isso coloca-se existencialmente a “identidade” e a “diferença" enquanto reconhecimento de si e do outro. O olho é o instrumento da alteridade cultural: aquilo que identifica o nós cultural separando essa identidade do existir do outro. O olhar carrega todo o arsenal ideológico disponível numa sociedade, não conseguindo, por vias não críticas, se libertar desse fundamento inescapável por sua própria atuação.
Sendo o olhar sempre o “olhar de um mundo”, a ocidentalidade é também uma grande maneira de ver e de impor esse ver como "a visão". O olhar ocidental é aquele que perdeu a certeza de ser o olhar de determinada sociedade e se disse o real do olhar. Vemos como nosso-deus “vê” o mundo e a cristandade vê aqueles que não são cristãos. A milenar prepotência do nosso olhar funda-se nesse mítico que sempre se considerou miticamente além do mítico. É olhar de determinado poder ordenador de instâncias sociais. Não é olhar descompromissado, mas olhar de certa moralidade: é olhar que julga e separa, aproximando ou distanciando o outro daquele deus que consideramos o único. É aquele que aponta o certo e o errado. Olhar que garante a vida ou a morte: aquilo que está próximo ao olhar, fraternalmente unido e certo, ou aquilo que está distante e é o outro a ser morto, devorado, escravizado, marginalizado, aprisionado ou esquecido.
O olhar no ocidente é o primeiro acesso ao monstruoso desvio ou o espelho-inverso do irmão. O criado e mantido por deus versus aquilo que se perdeu e outro criador o guiou à perdição. É olhar que “se criou” amando o outro para transformá-lo num igual: esse amor cessa na hora em que o outro recusa a deixar de ser ele mesmo ou se recusa a servir. O olhar ocidental não suporta a verdadeira igualdade. O olhar ocidental é olhar masculino, falus inescapável da Razão. Esse olhar duro é, na verdade, o nosso olhar. Essa dureza é a mesma do nosso real, tem todas as suas asperezas, todas as suas arestas finas e dolorosas. Toda a história do ocidente é a história desse olhar sobre si mesmo e sobre as outras sociedades e de como esse olhar de olho-gordo, olhar-secante, fixo e guloso, olhar da Medusa, formatou realidades completamente diferentes numa hegemonia duvidosa mas “sempre” mantida pelas armas do olhar e pelo olhar das armas. Noite e dia, olhar diuturno: olhar pornográfico fundando sua temporalidade. Olhar inescapável dentro dos sonhos, dentro do desejo, dentro de casa, dentro da carne e do lugar de trabalho, o olhar dentro da fala. O inferno está, no ocidente, sartrianamente, no olhar dos outros: olhar juiz, carcereiro e carrasco. Olhar que, no capitalismo, torna-se o olhar da coisa: reificado e reificador. Ele não vê mais senão coisas e relação entre coisas, como se os sujeitos fossem invisíveis. Relações sociais produtoras de mercadorias criando o olhar: o olhar do capital. E como a lógica do capital tornou-se a única fundamentação lógica do mundo, o olhar passa a ser o olhar dessa lógica. E somente esse olhar pode “passear”, como um grande olho metafísico carregando seu paraíso à tiracolo.
O turista só é possível no capital tornado fundamento vivo da sociedade. Antes do capitalismo não existiam turistas ou o olhar do turista. O viajante não é turista. Seu olhar é diferente. É ainda olhar tradicional. Julga mas não dissolve: acrescenta ao seu saber vivido os mundos fora do seu mundo.
O olhar do turista, olhar reificado por excelência, é sem profundidade: transparencializa sem se impor, olha sem se comprometer, olha sem olhar. Antes de olhar possui a certeza estabelecida por informações prévias. O olhar do turista não encontra o outro, mas estereótipos, modelos, esquemas. Seu olhar não é instrumento do vivido e da experiência, mas da confirmação. Ele não leva o mundo do outro para o campo vivo de um saber humano. Ele plasma, seja em fotos, filmes ou em narrativas esquemáticas, apenas o prefigurado e suas variáveis inesperadas. Vê as paredes do templo mas não sente, entende ou deseja naquela fé.
É o olhar das coisas sobre os homens. É o olhar permitido: o olhar do lazer, entretempo do tempo do trabalho. Não é o olhar da busca, mas o olhar do descanso da coisa sobre as coisas. Não é o olhar criador, mas o olhar da reprodução do capital descansando, em férias.

(Alberto Lins Caldas)



Geralmente, o defeito que notamos no outro são os nossos próprios defeitos projetados.

Ou, como disse Sarte no Huis clos: L'enfer, c'est les autres.

5.1.07

Doces mentiras



"Quanta verdade tristonha

Ou mentira risonha uma carta nos traz

E assim pensando, rasguei sua carta e queimei

Para não sofrer mais"
...



Porque eras assim, sob a toalha lunar


porque eras assim, sob a toalha lunar
e as estrelas debruçadas sobre ti, respirando
as tuas suspeitas noturnas. E ríamos mais
de vinte vezes por noite como
um ator antigo, que despe e veste
o próprio interior: ou como feiticeiros
com delicadas argolas de madrepérolas nos seios.
Mas também, às vezes, éramos barcas
muito pálidas, as proas perdidas no silêncio,
navegando devagar, com uma tristeza aberta e
pura por vento. E as nossas mãos abertas
eram velas, enlaçando, velejando. Nós,
finalmente, reduzidos a nós próprios
ao mesmo tempo.

(...)
e imagino agora todo o canibalismo
da tua docilidade, de onde emergia
um jardim intenso, onde teus olhos
adotavam nuvens. E eu, um alguém a serviço
dessa terra de borboletas, vivia entre
tulipas, piscinas de pólen, e me deitava
ao zumbido alado da vida intacta.
E enquanto trazias a virgem noite reclinada
sobre teus cabelos, quando a brisa
afaga as flores com doces mentiras, eu
tentava salvar-te de mim mesmo, de tua
terrível eternidade dentro
de mim. Observando. O quieto
navegar de estrelas em teus gestos revelando
que o teu sorriso é o universo
que tomba e te faz cócegas.

(Marcelo Sorrentino)



ACIDENTE DE PERCURSO


Teu mundo me veio de há pouco

e nele me perdi

Nessa one-way road impiedosa

teus faróis me iluminaram

antes que me lançasse longe

agonizante

o veículo que louco e vão

tentavas controlar...

Rastros de sangue na pista

sirenes e balbúrdia

O ar me falta e a dor consome

Pedestres se achegam

uns curiosos, outros indiferentes...

Nenhum beijo no asfalto!!!

A vida como ela é...

Sinais de vida no corpo inerte

Tum... tum... tum... tum...

- Afastem-se, senhores! Deixem-no respirar...

Tum... tum... tum... tum...

Tua imagem me vem em flashes...

Teus versos não são pra mim

Teu choro não é por mim

Nunca serei teu mundo

Não estou na tua pele

Não cuidarás desse pássaro aqui ferido

Não velarás meu sono

Não serei o fogo que te consome

Não cantarás pra mim

as músicas que te emocionam

Nem me verás nos filmes

que te encantam...

Tum... tum... tum... tum...

Tum... tum... tum...

Tum... tum...

Tum...


(Edmilson BORRET)

Da palavra arrancada à flor da pele

Quando todo silêncio é prefiguração de murmúrios. Quando toda palavra lançada foi vã. Mutilada. Conspurcada. Ultrajada. Abandonada. E sobeja no peito arfante a vontade urgente de desferir-te o soco final. De quebrar-te a cara. Arrebentar-te os dentes. E chutar-te as costelas. Puxar-te pelos cabelos. Arrastar-te por toda a cidade. Para a zombaria geral de todos os teus vizinhos. E amigos. E parentes. Gargalhar da tua roupa em farrapos. Colocar meu pau pra fora. Luzidio. Sob a luz pálida da lua. Fazer a dança da chuva. Rodear teu corpo ensangüentado. Mijar nos teus cortes e ferimentos. Escarrar na tua cara. Escarnecer de tuas quinquilharias. E banhar-te de lua, chuva, mijo, sangue e escarro. Não me apiedar de ti. E virar-te as costas em paz. E seguir rua abaixo. Assoviar um samba-canção. Olhar as casas do teu bairro evoluído e limpo. E parar no quiosque ao final da rua. Servir-me de uma farta porção de fritas. Parar sob a luz do poste. Ver meu rosto na vitrine em frente. E sentir um prazer brutal. Novo. E com as mãos ainda sujas do teu sangue. Lambuzadas do óleo das fritas. Bater de todas as punhetas a mais precípua. E esporrar nas tuas lembranças. Limpar as mãos no sobretudo. E sentir que recuperei minha palavra... E meu juízo...

(Edmilson BORRET – 05/01/07)





O que será que será?

O que será que me dá
Que me bole por dentro, será que me dá
Que brota à flor da pele, será que me dá
E que me sobe às faces e me faz corar
E que me salta aos olhos a me atraiçoar
E que me aperta o peito e me faz confessar
O que não tem mais jeito de dissimular
E que nem é direito ninguém recusar
E que me faz mendigo, me faz suplicar
O que não tem medida, nem nunca terá
O que não tem remédio, nem nunca terá
O que não tem receita

O que será que será
Que dá dentro da gente e que não devia
Que desacata a gente, que é revelia
Que é feito uma aguardente que não sacia
Que é feito estar doente de uma folia
Que nem dez mandamentos vão conciliar
Nem todos os ungüentos vão aliviar
Nem todos os quebrantos, toda alquimia
Que nem todos os santos, será que será
O que não tem descanso, nem nunca terá
O que não tem cansaço, nem nunca terá
O que não tem limite

O que será que me dá
Que me queima por dentro, será que me dá
Que me perturba o sono, será que me dá
Que todos os tremores me vêm agitar
Que todos os ardores me vêm atiçar
Que todos os suores me vêm encharcar
Que todos os meus nervos estão a rogar
Que todos os meus órgãos estão a clamar
E uma aflição medonha me faz implorar
O que não tem vergonha, nem nunca terá
O que não tem governo, nem nunca terá
O que não tem juízo

(Chico Buarque)

3.1.07

View from the top...



Lying in my bed
I hear the clock tick
and think of you
Caught up in circles,
confusion is nothing new
Flashback, warm nights,
almost left behind
suitcase of memories,
time after

sometimes you picture me
I'm walking too far ahead
You're calling to me,
I can't hear what you've said
Then you say - go slow - I fall behind -
the second hand unwinds

If you're lost you can look and you will find me
Time after time
If you fall I will catch you - I'll be waiting
Time after time

After my picture fades and darkness has turned to gray
watching through windows,
you're wondering if I'm ok
Secrets stolen from deep inside
the drum beats out of time

time after time
time after time
time after time
time after time

(Cindy Lauper / R. Hyman)


"Segredos roubados bem do interior,
O tambor bate sem ritmo..."

"Socorro, alguém me dê um coração!!! Que esse já não bate nem apanha..."


Filmes babacas também trazem algumas mensagens bem interessantes às vezes (ainda que tão babacas quanto...) Aí a loirinha sem sal da Gwyneth descobre que por mais alto que a gente tente alçar nossos vôos de independência e renúncia, todo piloto vai sempre precisar de um co-piloto... Sobretudo nos momentos de nevoeiro...

Senhores passageiros, queiram manter os cintos até aterrissarmos, por favor!

Putz! Mister Barreto fumou maconha com bosta de vaca dessa vez, hein! Caralho!

1.1.07

Feliz Aniversário, Daia !!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Putz! Essa mulher é especial até nisso. Veio ao mundo no primeiro dia do ano só para ofuscar os fogos de Copa. Ela não nasceu, ELA ESTREOU !!!! Assim ela não aniversaria, ela nasce a cada ano... Réveillon dos que lhe querem bem, alvorecer de promessas de felicidades para aqueles de quem ela se paroxima... Mulher bombril: de mil e uma utilidades, de mil e um adjetivos... Mil e uma palavras não bastariam para defini-la... mas ficarei como uma muito bem empregada por sua maninha: a Daia é fodona!!!!!!!!





THE DAIA’S WONDERFUL WORLD

labuta num mundo de sonhos
mora na terra dos meus sonhos
acorda na vida dos seus sonhos
ela é Maria como as outras
de Fátima, de Lurdes, da Conceição
maria de todas, maria de verdade
maria solidária, maria maria
je vous salue marie pleine de grace
que coisa mais linda mais cheia de graça
é preciso ter manha, é preciso ter graça
é preciso ter sonho sempre...
ela assiste à novela das oito
como quem lê saramago e nothomb
e ri e chora e canta e gargalha
na sua voz de tagarela estridente
mãe, amante, poliglota, concierge
passista de pantuflas e pijama
ela é carioca da gema, ela é bamba
almoça e escova os dentes num só tempo
assovia e chupa cana e roda a saia
roda, corre, salta e nunca desmaia
e ri de si própria... ela é a Daia

(Edmilson BORRET – 01/01/07)
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