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5.5.07

Sobre homens e mulheres

Possivelmente estarei incorrendo no maior mico da minha vida ao me debruçar sobre esse tema. Mas hoje tive uma experiência nada agradável ao atender o pedido de uma grande amiga para ingressar numa comunidade do orkut. E por conta disso senti a necessidade de escrever. Sou assim: incomodou, eu escrevo.


A proposta da comunidade seria justamente discutir o velho e eterno embate entre homens e mulheres -como se isso fizesse algum sentido. No meu parco entender das coisas, homens são homens e mulheres são mulheres. E pronto. Isso deveria bastar, não? Por que tentar buscar diferenças quando estamos falando, em última instância, de pessoas? E pessoas são, antes de qualquer coisa, sentimentos. Bons ou ruins, nobres ou vis, simples ou complexos, mas sentimentos, porra! E então me vi lá nessa comunidade cercado pela torpeza maior que pode assolar o ser humano: a dificuldade para o afeto puro e simples. Era um desfile absurdo de nicks estranhos desfiando um amontoado de asneiras que me irritava profundamente: tinha um tal de “LordKazzado”, tinha um tal de “1 Brasa Mora”, tinha até mesmo um tal de “Lex Luthor” (e o Super-Homem, caramba? e o verão como apogeu da primavera, cadê?). E as comunidades em que essas figuras grotescas estavam inscritas!!!! Misoginia digna de tratamento psiquiátrico, caso grave mesmo, para internação e camisa de força... Só para se ter uma idéia, um dos nicks criativos aí citados parece ter percorrido todo o orkut atrás de comunidades que tratam a mulher como lixo: “Mulé é bicho burro mermo”, “São tudo umas vagabunda”, “Amigo de mulher é cabeleireiro”, "Elas preferem os canalhas", e por aí vai... Antes que eu tivesse que fazer uso de toda a minha cartela de Plasil, eu pulei fora da tal comunidade da minha amiga. Não sem antes expressar todo o meu incômodo com tamanho pensamento torto. Então, a anta neanderthalesca das comunidades aí citadas ainda veio com um discursozinho babaca, mal embasado, pobre e ortograficamente mal escrito sobre a minha “visão limitada acerca da hipocrisia da nossa atual sociedade, principalmente quando se refere às mulheres que se colocam num altar acima do bem e do mal, continuando-se a fazer vistas grossas perante o comportamento fútil das mesmas”... Puta que pariu! Tenho alunos da 8ª série que conseguem produzir textos mais densos que isso, na boa!


Com todo o respeito e carinho que tenho por essa minha amiga, mas criar uma comunidade para discutir diferenças entre homens e mulheres requer uma mais bem elaborada lista de convidados e uma maior seletividade de cabeças pensantes. Senão, corre-se o risco de cair na discussão do sexo dos anjos... feita por sexólogos de mesa de bar...


Quando nos propomos a pensar na diferença sexual, a primeira pergunta que se impõe é a mais elementar: por que a raça humana está dividida em homens e mulheres? Se não sabemos responder a esta pergunta, dificilmente poderemos saber em que consiste ser homem ou mulher, dificilmente poderemos entender como têm de ser as relações entre eles.

Nós, homens e mulheres, temos muitas coisas em comum: a dignidade humana, a inteligência, a capacidade de iniciativa, a responsabilidade, a necessidade de afeto, carinho, segurança e, por que não, de sexo também. No essencial, temos uma mesma natureza, que adquire matizes diferentes segundo se expresse em masculino ou em feminino. Temos quase tudo em comum. Onde reside a diferença sexual??? A única resposta possível e convincente repousa no campo da fisiologia: a necessidade de gerar filhos. Se não fosse necessário ter filhos, as pessoas não se dividiriam em homens e mulheres. Ou então as relações de amor e sexo entre homens e mulheres seriam distintas das que são agora. No entanto, se existe o amor e o sexo entre homem e mulher, é porque existem homens e mulheres. E isto leva-nos a considerar que aquilo que é específico e diferenciador do homem é ser um possível pai, e aquilo que é específico e diferenciador da mulher é ser uma possível mãe. O resto é comum a homens e mulheres. E ponto.


Não satisfeito com o leque de asneiras desfiado, o mesmo babaca do nick e das comunidades sui generis acima citado ainda me sai com essa pérola sobre a “Ame e dê vexame”, comunidade que tenho no orkut: “E sua comunidade ADV é rídicula cara. Não passa de um incentivo a bajulação, tornando os homens cada vez mais capachos das mulheres. Se declare para a sua amada e se jogue no chão pra que ela limpe os pés nas suas costas”... Muito provavelmente esse rapaz tem algum problema sexual grave, algo talvez que lhe ocasiona uma distensão traumática da região retofuricular. Eu aconselharia o coitado a procurar o doutor Agamenon, psicoprocotologista de renome, para cuidar do seu caso, pois “este tipo de distensão, se não tratada a tempo, pode se agravar e resultar numa ruptura dos ligamentos e desabamento da prega-rainha, estrutura nervimuscular que dá sustentação ao pavilhão lombo-retofuricular do indivíduo diletante”, palavras desse renomado profissional... hehehehehe


Mas voltando à seriedade necessária à discussão, lamento que esse indivíduo possua essa tão arraigada dificuldade para se declarar a sua amada. É um infeliz que vai viver constantemente um embate. Mas não embate entre homens e mulheres, e sim o embate entre ele e ele mesmo, coitado. Tenho plena consciência que o pequeno parvo nunca virá até aqui ler este texto, mas deixo aqui dois exemplos de homem e mulher que souberam magnificamente levar ao extremo a bajulação ao sexo oposto, numa linda declaração associada ao ato de homem e mulher deporem as armas um diante do outro... E eu assinaria embaixo os dois textos!!!!




Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor.

(...)

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor.


(Vinícius de Moraes)




Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver !
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida !


Não vejo nada assim enlouquecida ...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida !


"Tudo no mundo é frágil, tudo passa ..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim !


E, olhos postos em ti, digo de rastros :
"Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus : Princípio e Fim !
..."


(Florbela Espanca)

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