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10.3.09

"Provavelmente não há Deus. Então pare de se preocupar e aproveite a sua vida"

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Esta frase inteligentíssima anda circulando nas laterais de ônibus (os chamados “ônibus ateus”) nas grandes capitais européias recentemente. E, como era de se esperar, tal frase tem suscitado reações por parte da cristandade que chegam a beirar a bestialidade. Em Gênova, a concessionária de publicidade nos meios de transporte públicos IgpDecaux considerou que o slogan é provocatório e não se enquadraria no código de ética da propaganda italiana. E aí eu fico me perguntando o que essa mesma concessionária diz a respeito dos vários panfletos e anúncios que vemos em ônibus e outros locais públicos quando das ocasiões festivas em homenagens às tantas “nossas senhoras” que a cristandade resolveu adorar. Dois pesos, duas medidas?! Cômodo, não? A associação italiana União dos Ateus e Agnósticos Racionalistas (UAAR) resolveu entrar com uma representação contra a concessionária e pedir que a prefeitura de Gênova revogue o contrato com a IgpDecaux. A prefeita da cidade, que é laica, tinha se declarado favorável à campanha, realçando o direito de liberdade de expressão. A UAAR pretende ir até a Corte de Justiça Européia, se for necessário. Pois é, lá esse papo de direito de expressão é levado muito a sério. Aqui no Brasil, anúncios como esse nem teriam chances de serem vinculados. Num país em que até mesmo manifestações artísticas como novelas, filmes, peças de teatro, desfiles de escola de samba, etc. são monitoradas pela santa igreja católica e protestante em busca de ímpios iconoclastas, imagina se um grupeco de ateus teria vez e voz.

Quando, há alguns meses atrás, resolvi “sair do armário” e me declarar ateu, provei o amargo gosto de todo o preconceito e discriminação declarados que até então eu nunca havia provado em toda minha existência. Mesmo tendo nascido negro, pobre e fudido, se preconceitos sofri na vida por conta dessa origem, estes foram, em sua grande maioria, velados e/ou dissimulados. Mas quando resolvi gritar “sou ateu”, choveram esculhambações abertas de toda parte. Eu poderia ter dito que gosto de comer criancinhas (“comer” no sentido de “deglutir”, ok?), que me amarro em dar a bunda ou qualquer outra coisa considerada cabeluda pelo senso comum, mas jamais afirmar que deus não existe. Isso não! As pessoas de bem não estão preparadas ainda para uma declaração tão bombástica assim...

As pessoas de bem excomungam meninas de 9 anos que abortaram depois de terem sofrido estupro cometido pelo próprio padrasto, mas não excomungam o estuprador. “O estupro é algo menos grave que o aborto”, segundo a lógica torta do arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho. As pessoas de bem se engalfinham para provar que são mais “de bem” que seus pares: matam semelhantes por suas crenças, mandam semelhantes para a fogueira ou para os campos de concentração e extermínio, empurram semelhantes para as faixas de Gaza e guetos mundo afora, desconsideram heranças culturais e étnicas ao demonizarem semelhantes em emissoras de TV e jornalecos distribuídos nos templos nababescos de bispos abastados pelo dízimo dos fiéis.

Mas o que mais me terrifica nas atitudes das pessoas de bem é a lavagem cerebral nefasta que ultimamente elas têm se empenhado em fazer nos jovens e adolescentes. No meu Orkut é crescente o número de alunos adolescentes que estampam em seus perfis o fato de serem protestantes... O problema é que a maioria deles nem sabe o que significa isso. Papagaios de pirata que são, repetem bordões do tipo“só Jesus salva”, “deus 100% fiel”, “eu acredito e confio em deus”, mas ostentam nicks do tipo “putão”, “muleke prostituto”, “muleke 157”(referência ao art. 157 do Código Penal que trata de roubo e latrocínio). Não que um prostituto (ainda que apenas no reino do virtual) ou um “ladrãozinho da boca pra fora” para impressionar as “gatinhas” não possa se declarar protestante. Mas o que percebo aí é a falta de convicção desses adolescentes, observada de forma flagrante em suas atitudes e pensamentos e revelada num breve passeio pelas suas descrições orkutianas, suas comunidades, seus vídeos do youtube, etc. Ouviram o galo cantar sem saber onde. Seus pastores (talvez lobos guardando ovelhas) acenam-lhes com promessas de vida eterna, não importando suas atitudes questionáveis ou delinquências visíveis: o que importa é atrair esses jovens para a seita. Ainda que eles não tenham a mínima idéia do que estão bradando ao propagarem o“só Jesus salva”, o que importa é que eles bradem com toda a força de seus jovens pulmões. Algumas dessas seitas chegaram ao cúmulo de se apropriarem daquilo que mais agrada a esses jovens, a cultura questionável do funk erótico, para levar adiante seu processo de lavagem cerebral. Adaptaram a sofrível “dança do Créu”para o universo cristão. É grotesca a cena nos templos: jovens rebolando a bundinha e a pélvis, executando gestual abertamente erotizado, quase que em transe, hipnotizados, repetindo palavras que parecem em total desacordo com a mise-en-scène que se vê: “Pra ir pro céu tem que ter muita oração/ Pra ir pro céu tem que ter é santidade/ O inimigo, ele não dá mole não/ Porque só Jesus Cristo é que salva de verdade/ Céu, céu, céu, céu, céu”... Tudo é válido, segundo os pastores dessas seitas. O negócio é arrebanhar um número cada vez maior de jovens. Seria cômico, se não fosse trágico. Vejam os vídeos:






Numa sociedade de pessoas de bem, há leis que protegem nossas crianças e adolescentes do assédio de, por exemplo, pedófilos e aliciadores do tráfico; mas infelizmente não há leis que os protejam da sanha dos sacerdotes. Estes tão ou mais perniciosos que aqueles...



E tudo isso por quê? Porque a humanidade não consegue viver sem seus mitos, não consegue sobreviver enquanto humanidade se não puder depositar o mérito de seus sucessos ou fracassos numa força sobrenatural, numa deidade qualquer: deus, jeová, alá, shiva, oxalá, osíris e tantos outros. Se, para fazer parte desse seleto rol das pessoas de bem, eu tiver que me render a essas deidades, prefiro ser olhado de esguelha pelos meus detratores. Decididamente, por essa ótica caótica, nunca serei uma pessoa de bem...
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