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9.4.11

"Vivemos esperando dias melhores"

(Autoria da foto: Edmilson Borret - 11/12/2009)


Hoje, sábado (09/04/11), não pretendo fazer absolutamente nada além de vivenciar, enfim, meu profundo luto; algo que para mim se faz necessário até mesmo para recuperar o equilíbrio, para manter o discernimento que o momento exige e para, principalmente, tentar fugir à espetacularização desta tragédia por uma mídia profundamente irresponsável, calhorda, leviana e desrespeitosa.

Em situações de comoção como essa, tendemos a procurar explicações: a dor rejeita palavras de conforto, a dor não anestesiada lateja tentando entender o que, no fundo, não se explica. Nenhuma explicação caberia para esta situação. Não farei, de forma alguma, nenhuma consideração sobre o racismo, sobre os crimes de ódio (os "hate crimes", como dizem os americanos) por conta da misoginia, sobre a demonização do islamismo, sobre o bullying nas escolas, sobre a cultura de violência no ambiente escolar ou sobre o abandono e a desvalorização da educação pública por décadas de total descaso. Esses são, sem dúvida alguma, problemas sérios para os quais devemos buscar continuamente soluções efetivas. Esses problemas, entretanto, não dão conta de explicar o que ocorreu na minha escola no fatídico dia 07 de abril de 2011.

Não cabe agora, tampouco, exigir que as escolas (públicas ou privadas) se transformem em bunkers. Como bem observou o ministro Haddad ontem lá na escola em entrevista coletiva, se as escolas vierem a se transformar no modelo de segurança exigido pela opinião pública insuflada pela mídia, teremos qualquer coisa outra, menos uma escola. Vale lembrar também que a Tasso sempre foi uma escola com um perfil acolhedor, referência na região do modelo inclusivo e da participação da comunidade; e assim pretendemos que ela continue sendo. Ademais, nossa escola conta com, pelo menos, dois dispositivos que a cultura moderna desde George Orwell já vinha preconizando como pressuposto de segurança e controle: a escola possui portões eletrônicos e câmeras na entrada, no pátio e nos corredores. E aí eu pergunto: do que tudo isso adiantou? Escolas americanas, além das câmeras de segurança, têm detectores de metais; nem eles impediram massacres como o que aconteceu há doze anos em Columbine e quinta-feira na minha escola. Até mesmo a Finlândia, país tido como modelo da melhor educação pública do mundo, já vivenciou tragédia semelhante a essa.

Tampouco cabe agora condenar os proselitismos religiosos que surgem na esteira dessa tragédia. Como ateu que sou, não vou de forma alguma aqui condenar as religiões pela lavagem cerebral que algumas denominações costumam fazer nas cabeças de jovens como o Wellington. Embora eu saiba que, se aproveitando da tragédia, surgirão setores da sociedade conservadores e oportunistas afirmando que não temos "deus no coração" e que, por isso, estamos pagando caro: calhordas religiosos infiltrados na política, como o infeliz fundamentalista cristão deputado Marco Feliciano, já afirmaram isso com todas as letras. Surgirão outros do estilo dele e de um Bolsonaro que pregarão uma cartilha de etiquetas cada vez mais retrógadas para nossos adolescentes e exigirão - tudo em nome de deus, da pátria e da família - medidas de segurança máxima em nossas escolas oprimindo ainda mais os adolescentes. Os fantasmas da Educação Moral e Cívica e do Ensino Religioso (confessional ou plural, obrigatório ou opcional) surgirão como a luz no fim do túnel, a esperança única para essa sociedade tão deturpada, segundo a visão dessas pessoas... Não. Não vou me ater a essa discussão. Até porque tudo que poderia falar sobre isso eu já deixei claro em postagens anteriores bem mais bombásticas onde exponho minhas opiniões sobre o tema.

Hoje, com a calma e serenidade que o meu momento de luto me traz, quero apenas falar de esperança, de reconstrução e de otimismo. Como educador e, principalmente, como professor da escola onde a tragédia aconteceu, preciso manter esse estado de espírito otimista e esperançoso para poder acolher nossos alunos quando eles regressarem. Esse meu blog que sempre foi conhecido por sua postura questionadora, escrachada, iconoclasta e zombeteira, hoje muda um pouco o tom.

O jornal Extra, de forma totalmente irresponsável, achou no Youtube um vídeo que criei no final do ano passado em homenagem aos formandos e tentou fazer um pouco mais de sensacionalismo: destacou uma frase dita por um dos formandos no vídeo num contexto totalmente outro e colocou-a como uma forma de vaticínio da tragédia que ocorreu na quinta-feira. Imediatamente (em menos de 48 horas) os acessos ao vídeo subiram de parcos 500 para mais de 40.000 até agora. Curiosamente, o tiro saiu pela culatra para o jornal. Ao invés de suscitar reações de espanto diante da tal "premonição" do aluno e assim corroborar a visão do jornalista (ir)responsável pela matéria, o vídeo só fez aumentarem as mensagens de apoio e solidariedade; além de suscitar nas pessoas os sentimentos de esperança e otimismo dos quais falei acima. A música que utilizei, o poema e o depoimento dos alunos, tudo isso vai servir de material necessário agora à reconstrução do nosso espaço escolar. Os versos que abrem o poema de Oswaldo Montenegro serão doravante quase que nosso lema, quase que nosso projeto político-pedagógico:

"Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio"


Mais adiante no poema, outros dois versos espelham exatamente a atitude que norteará nosso trabalho para recuperar a confiança e a alegria tanto de alunos quanto de professores e funcionários:

"Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba"


É isso. Como diz a música do vídeo, "vivemos esperando dias melhores, dias em que seremos melhores, melhores no amor, melhores na dor, melhores em tudo". No momento, estamos nos esforçando para nos mantermos melhores na dor. Mas chegará o dia em que ela, a dor, estará superada (não apagada nem esquecida, mas superada) e poderemos novamente ser MELHORES EM TUDO...




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