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3.5.11

Justice has been done... Really?


A sensação que tenho é que estamos vivendo uma grande farsa. Todos os jornais que leio, todas as páginas de notícias na internet, todas as tv’s do mundo – tudo repetindo o mesmo sentimento: “justice has been done”. E se eu não me policio, corro o risco de acreditar mesmo que alguma justiça foi feita. Uma justiça bem ao gosto americano, uma justiça que não reconhece nenhum Estado de Direito, uma justiça baseada na lei de talião, uma justiça como a que se vê em passagens do Velho Testamento. Aqui no caso, olho por olhos, dente por dentes: o sangue que escorreu de duas torres enfim vingado na foto-montagem de um corpo atirado às vagas do mar.

Vejo americanos felizes pelas ruas, festejando, comemorando, dançando e gargalhando. Uma festa pela morte! Vejo comparações estranhas com velhos fantasmas de ditadores sanguinários – o que justificaria a morte. Hitlers, Mussolinis, Stalins, Saddams e toda uma longa corja de vultos negros assassinos voltam correndo para o inferno acompanhados de mais um representante do Mal. O Mal, mais uma vez, foi vencido. O sol há de brilhar mais uma vez. A luz há de chegar aos corações. A câmera, primeiro em plano fechado, enquadra o rosto de um presidente-herói saudando a multidão mundial; depois, num plano aberto, vai subindo numa grua e faz um longo take épico, panorâmico, dos rostos felizes quase em transe, das bandeirolas em punho, das crianças alçadas aos ombros de pais orgulhosos do american way life.

Um filme. É isso: um filme. Minha sensação de estar vivendo uma grande farsa vai, pouco a pouco, esvaecendo. Já não sei mais o que é realidade, o que é ficção. Roteiristas muito bem treinados, enredo perfeito, atores maravilhosos, fotografia, efeitos especiais, figurino e maquiagem – tudo perfeito.

Tudo perfeito... se não fosse tudo tão velho! Tão velho quanto o mundo, tão velho quanto o homem e sua barbárie em nome de deus, da família, da propriedade, da pátria e da liberdade. Dominus dominium juros além.

Saio caminhando, feito um zumbi, um extraterrestre, um Neo em sua Nabucodonozor tentando furar caminho em meio a uma gente risonha e festejante, a noticiários que me chegam de todos os cantos e que me convidam para a nova era. Entro na primeira biblioteca pública que encontro e vou direto às estantes dos livros de História. Quero um pouco de realidade, uma lufada de ar fresco. Folheio (em dúvida mesmo sobre a real validade do que leio) compêndios e mais compêndios sobre impérios que se ergueram graças à dormência dos sentidos de milhares de milhões de seres humanos. Impérios e seus governantes que atacaram outras nações, que mataram, que saquearam. E sempre com o aval de todo o restante da humanidade. Eram homens de bem – que se registre! Se atacaram, se mataram, se saquearam, foi tudo por um bem maior: a Liberdade. Mas, no meu entender deturpado pela minha condição de zumbi, não eram homens de bem. Eram loucos. O problema é que eram loucos que se tornaram representantes de Impérios. E, a partir do poder, podiam moldar a humanidade toda à sua loucura: e a isso se chamou de engenharia social.

Fecho o livro que folheio. Olho em volta. A alegria reinante parece que vai durar a noite toda. Estão todos inebriados. Saio da biblioteca. Toda cultura parece inútil agora. Preciso voltar para casa. Tomo as ruas mais uma vez tentando, com muito esforço, não esbarrar na alegria alheia. Chego em casa, fecho as janelas, cerro as cortinas, desligo a tv. Lá de fora ainda me vêm o som de alguns fogos ao longe, de algumas gargalhadas e festejos. Por que só eu não estou no clima de festa?

No escuro, tateio as paredes e vou até os meus CDs. Preciso de uma música para abafar tanta comemoração que vem lá de fora. Enquanto escolho o cd, penso que no justice has been done at all. Mas o que posso eu contra o senso comum no final das contas? Acho, finalmente, o cd que procurava...


Faces sob o sol, os olhos na cruz
Os heróis do bem prosseguem na brisa da manhã

Vão levar ao reino dos minaretes a paz na ponta dos arietes

A conversão para os infiéis

....
Ah como é difícil tornar-se herói
Só quem tentou sabe como dói
Vencer Satã só com orações
....

Ê andá pa catarandá que Deus tudo vê
Ê anda, ê ora, ê manda, ê mata

Responderei não!

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