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24.8.12

Ensaio sobre a babaquice


Ah, os babacas... Os babacas são seres que merecem um capítulo à parte em todo e qualquer estudo que se queira mais abrangente sobre a natureza humana. Toda filosofia, toda sociologia, toda arqueologia, toda psicologia ou qualquer outro campo do conhecimento humano que não incluir um estudo sobre a babaquice em seus anais, estará epistemologicamente fadado a uma apreciaçã
o capenga do gênero humano por conta de uma má delimitação do corpus de estudo e pesquisa.

Antes de qualquer coisa, é preciso que se saiba que babacas existem por toda parte. E há os babacas dos mais variados tipos. Tem o babaca temporário, que resvala na babaquice por alguma contingência do espírito - o que não faz dele menos babaca. Tem o babaca aliciado: aquele que teve ou tem amigos que vivem na babaquice e que o levaram a experimentar a primeira dose da mais pura babaquice. Daí por diante, foi um mergulho vertiginoso no cruel mundo da babaquice. E se ele deixa de ser babaca por algumas horas que seja, tem crise de abstinência. Tem o babaca congênito: a babaquice, nesse caso, é quase atávica. A ciência ainda pesquisa e procura desenvolver um teste do pezinho eficaz para diagnosticar esse tipo de babaca ainda nos primeiros minutos de vida.

Babacas serão sempre babacas, não importa o quanto se esforcem para que a babaquice pareça menos babaca. Aliás, é típico dos babacas quererem parecer algo que não são: donde concluímos que os babacas não são nada confiáveis. E os babacas não têm noção de limite. Eles se espalham. Podemos esbarrar com babacas onde menos esperamos. Uma amiga minha há muito tempo não faxinava a casa. Quando resolveu fazê-lo, achou (pasmem!) um babaca morto, ressequido, atrás do bufê da sala de jantar. Tomou um susto a coitada. Difícil mesmo foi convencer os parentes, amigos, vizinhos e conhecidos que ela não sabia como aquele babaca tinha ido parar ali... Cá entre nós, essa minha amiga sempre teve uma queda por babacas.

Um babaca, para ser babaca, não precisa de muita coisa: basta água, comida e luz do sol para que um babaca cresça e não desapareça. Mas não se enganem: babacas não são organismos simples, como os platelmintos ou os anelídeos. Há bastante complexidade num babaca. Não à toa, existem até mesmo babacas que escrevem ensaios sobre a babaquice...

Babacas, via de regra, se orgulham da própria babaquice. E isso chega a ser tocante... Babacas não têm problemas de baixa autoestima. Ah, e como eles estão sempre felizes os babacas! A gente nunca sabe por que eles estão tão felizes (nem mesmo eles sabem), mas perto de um babaca a gente corre até mesmo o risco de achar que o babaca encontrou a fórmula ideal do “joie de vivre”. É preciso um tremendo esforço para não sermos contaminados pelo babaca. Identificou-se um babaca, recomenda-se manter certa distância: a babaquice pode certamente ser passada por osmose.

Alguns babacas são mesmo capazes de amar. Sim, babacas também têm coração. Mas cuidado com eles quando estão apaixonados: um babaca apaixonado multiplica exponencialmente sua babaquice! Exponencialmente e geometricamente, já que babacas nada mais são do que bestas quadradas. Há tristes relatos sobre babacas que se apaixonaram e se tornaram tão mais grandiosa e transcendentalmente babacas que sumiram na própria babaquice, assim como por encanto: fez-se um clarão imenso e... ploft! Sumiram, retornaram ao Nada original.

Há quem considere que a babaquice é um estilo de vida. Estão surgindo até mesmo revistas e outras publicações especializadas no que se convencionou chamar “the babaquism way life”: uma tendência, dizem os mais descolados. Mas é complicado reconhecer um babaca na rua ou em qualquer outro lugar. Porque, diferentemente das outras tribos, o babaca não apresenta traços, adereços ou acessórios que nos permitam identificá-los assim tão facilmente: não há um tipo de cabelo específico, um tipo de roupa, um tipo de música só deles. Os babacas, justamente por isso, se misturam facilmente em todos os grupos. Para reconhecer e identificar um babaca, só mesmo travando conhecimento com o mesmo. Por isso, mais uma vez, recomenda-se cuidado. Percebeu que é um babaca, afaste-se rapidamente: olha a osmose!
Mas os babacas, algumas vezes, são até bonitinhos... Ah, e são limpinhos também.

Há, entretanto, uma característica da babaquice que eu considero super legal, que eu diria até mesmo humanista: a babaquice é uma das coisas mais democráticas que conheço. Tem babaca pobre, tem babaca rico, tem babaca negro, tem babaca branco, homem, mulher, gay, lésbica, judeu, cristão, ateu, letrado ou iletrado; tem babaca no nordeste, na Amazônia, no centro-sul, em Nova Iorque, em Taiwan, na Sibéria e na puta-que-o-pariu. Babaca não escolhe onde nem quando nascer. Na história da humanidade sempre houve babacas, desde os primórdios, desde a pedra lascada. Acredito mesmo que já havia babacas já no gênesis e em todos os outros mitos da criação de que se tem conhecimento. A babaquice, na verdade, deve ser o que os babacas chamam de pecado original.

(Edmilson Borret – 24/08/2012)

5.4.12

Do Dia Que Precede a Noite

(Autoria da foto: Edmilson Borret - 27/09/2009)




Ao amigo Jorge Willian


Acostuma teu peito, amigo
Que a vida tem dessas coisas
Corre ao bar da praça
Pede a cerveja mais gelada
E espera pelo magnífico pôr-do-sol

E quando a noite tiver caído
Noturna e inevitável
Como toda noite sempre será
É disso que te lembrarás:
Que estavas naquela mesa de bar
Que conheceste a novidade do dia
Tiveste a sorte do final de tarde
E assististe ao magnífico pôr-do-sol

Feliz o homem que ainda é capaz
De fazer do dia e da tarde uma novidade
Por isso - só por isso
Exatamente por isso e por mais nada
Acostuma teu peito, amigo!

(Edmilson Borret – 11/03/2012)

1.4.12

Não quero ter hora

(Autoria da foto: Edmilson Borret - 13/06/2009)

Eu não quero ter hora pra nada
Não quero ter hora pra acordar
Nem pra dormir, nem pra sonhar
Não quero ter hora pra nada

Não quero ter hora
Para escovar os dentes
Não quero ter hora pra ser diferente
Não quero ter hora
Pra te quebrar os dentes

Não quero ter hora pra ser gentil
Pra ser canalha, pra ser otário
Não quero ter hora pra você
Nem pra tevê, nem pro noticiário
Não quero ter hora pra nada

Não quero ter hora pra amar
Pra fazer a barba, nem pra comer
Não quero ter hora pra entender
Entender o quê?
Não, não quero ter hora

Não quero ter hora
Pras cartas dos náufragos
Pro almoço em família, nem pras procissões
Nem pra sua revolta, sua mágoa
Não quero ter hora pra fazer concessões
Pra mãe que chorou porque a filha casou
Pro homem sob a marquise
Pro menino no sinal
Pro tédio, pra chuva, pra lua
Pro bloco de carnaval

Não quero ter hora pro meu cinismo
Pra fraqueza do mundo
Pra dor do mundo, pra fome do mundo
Não quero ter hora pra nada
Pra nada, pro mais profundo
E absolutamente nada
Só quero ter hora
Pra minha hora – e mais nada!

(Edmilson Borret – 10/03/2012)

31.3.12

Desuso


É como um corte em evidência
na castidade dos puritanos
na ingenuidade das meninas
na maledicência dos suburbanos

As manhãs são de desmaio
as tardes de calçada e incertezas
e as noites podem doer
como o sujeito que se projeta
do viaduto, no minuto (exato!)
do sangue arder

(Edmilson Borret – 29/02/2012)


(Autoria da foto: Edmilson Borret - 12/01/2012)

29.2.12

POEMA DE QUANDO VOCÊ SE FOI

(Autoria da foto: Edmilson Borret - 21/02/2012)


o som daquela porta fechando
ainda dói no estômago
mastigo e engulo a ranitidina
com a lágrima do entre nós
o azul caído da tua retina
ainda impregna as paredes
ainda ilumina o meu quintal
escorre das fronhas e lençóis

o vidro da lente que te viu
se mistura agora no chão
com o copo que se partiu
onde antes era uma casa
arrumada
e agora não há nada
além de velhas canções e a poeira
ficou o teu cheiro na toalha
ficou a dor no estômago
ficou o colorido da pulseira

How i wish
How i wish you were here

(Edmilson Borret – 21/02/2012)

13.1.12

Inventário


Não sou um homem.
Sou um menino em pele de homem.

Porque o tempo vai apagando
os traços da inocência,
o menino se debate sob a pele,
as unhas arranham
e rasgam a pele -
Os rasgos se cicatrizam.

Às cicatrizes dão o nome
de rugas.

(Edmilson Borret – 08/01/2012)

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