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14.4.07

Existirmos: a que será que se destina? Parem a Stultifera Navis que eu quero descer!!!!!!!


Pode parecer loucura (e, se parece, certamente o é), mas a impressão que tenho (aliás, eu não a tenho, ela me tem... me persegue até) é a de que estou apenas ensaiando para a grande estréia do meu momento de felicidade. Só que o puto do diretor não estabeleceu nem a bat-hora nem o bat-local da mise-en-scène. Enquanto isso, essa tal de felicidade está por aí, feito uma puta qualquer pelos trottoirs e parques da vida, se entregando a todos, vadia e rameira como sempre; e eu aqui vou pegando uns pedaços de texto aqui e ali (sem rubricas do autor) e me viro com as marcações que eu mesmo crio, apesar da fraca memória.
No mais das vezes, conseguindo disfarçar minha inerente veia canastrona, faço do ensaio o espetáculo. Mas é terrivelmente foda que antes mesmo de cair o pano já foi a minha máscara que caiu. E dá-lhe ovos e tomates!!!! Mas aí me lembro que é só ensaio (e esse puto do diretor que não marca essa data!!!), e continuo na espera do grand finale. Sempre esperando, sempre ensaiando (pra quê, meu Deus?) e sempre me perguntando... Quando, onde, como, quando, onde,como... é agora? tá na hora? é agora que eu entro?... E essa dúvida parece ser o leitmotiv das minhas inquietações (que algum louco mais louco que eu poderia até mesmo confundir com traço trágico-poético). Sinceramente não me lembro de quando nem onde pela primeira vez essa dúvida mal elaborada se insurgiu contra as minhas certezas, mas posso afirmar que ela nada mudou no destino da humanidade... E nem vai mudar, se querem saber. Sou eu comigo mesmo e a minha dúvida: - Quando, meu Deus, quando a Felicidade vai chegar?
E há tempos ando assim, meio a esmo por esse emaranhado de ruas desconhecidas, sem gps, sem combustível e, como na música, "a corda quebra, o carro pára e o riacho fica fundo".... Só que eu tenho medo, ouviu?
E assim eu vou acordando de manhã em manhã, esperando que a felicidade tenha vindo bater a minha porta, ou quando muito deixado um recado. Mas a puta não manda nem um e-mail, nem telefona pra dizer "tô chegando, querido, só peguei um pouco de trânsito no caminho". Decididamente essa filha de uma égua chamada felicidade não está entre os meus contatos, nem é minha amiga no orkut. Ela está por aí (cachorrona, vaca, vadia), num dia de sol, céu azul sem nuvens, correndo, faceira e lépida. E sabem por quê? Porque a felicidade é saudável, é bonita, é malhada, corpo sarado e bronzeado. Aliás, os amigos dela, os que andam com ela pra cima e pra baixo, também o são. Eles, sortudos que são em tudo, não ficam sofrendo pelos cantos, nem chorando ausências, nem se escravizam a coisas em que não acreditam ou não merecem, e nem de longe pensaram algum dia que não merecem o que desejam. Eles são bons em tudo, os amigos dela.
Mas eu espero... sempre espero. Os nós dos dedos tamborilando no tampo da mesa, eu espero, paciente que sou. E fumo mais um cigarro, e mais um e mais um... e lá se vão um maço, dois maços, três maços... e metade do meu pulmão no cinzeiro.
É, meu velho Torquato, e o Caetano ainda te pergunta (tardiamente, é certo, mas pergunta): "Existirmos: a que será que se destina?"... Fosse eu, mudaria o verbo: a que será que se desatina... E eu faço o quê, meu velho, para parar de me sentir um maior abandonado?... O quê? Ah não, isso eu já tentei... O quê? Pra você deu certo? Mas porra, cara, você pelo menos escreveu um livro!! Eu nem isso ainda. E nem plantei uma árvore e nem tive um filho. Meus últimos dias seriam mais paupéria que os seus, pode acreditar... na boa.
Mas, voltando a falar da tal vagabunda da felicidade, teve um dia em que pensei tê-la visto me acenando e gritando lá da rua. Tava ela lá com os amiguinhos dela sortudos em tudo, fazendo um buzinaço do caralho de acordar toda a vizinhança, a mal-educada. E ainda gritava: "- Rápido, ô viado, vem aqui fora. Rápido que você já não está mais em idade de se fazer esperar!" E ainda me sacaneava, a escrota... O foda é que eu não sabia direito se devia ir ou não... E se não fosse mais ensaio? Será que eu estaria preparado? Será que já era o momento de encarar a platéia, de cara limpa, e dizer, como você disse, meu velho, num só ato, sem medo da dona Bárbara:

eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível
eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora
eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim
eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranqüilamente
todas as horas do fim


Caguei no pau, cara. Não fui. Ou fui, mas num passinho de bebê engatinhando. Quando cheguei, já era tarde. A puta já comia pneu na esquina e os amiguinhos sortudos em tudo gargalhavam da minha cara de pastel. Não era ensaio. Só que não prestei atenção ao terceiro sinal... Diretor mais filho da puta também que nem me avisou que era a hora!
Mas, cara, na boa, qualquer dia eu desisto desse ensaio insano, ponho fogo no figurino, arrebento o cenário a marretadas, rasgo os cartazes e o texto. Alopro de vez. Porque, mesmo que eu assim por um acaso da vida (é, dizem que eles ocorrem) estreasse finalmente, quem me garante que a crítica me seria favorável? Você sabe, né, dona Bárbara é foda! E quer saber? O outono já chegou aqui no Rio. Tá tudo assim meio cinza mesmo. O que é um pé no saco mesmo é essa certeza das horas que precedem a aurora, quando me dou conta que não haverá mais noite dormida... quando muito, mal dormida. São horas indubitavelmente de solidão. Mas uma merda de solidão cheia de ruídos e vozes entrecortadas que me dizem a todo momento, numa torrente pavorosa de avisos, recadinhos babacas e conselhos do tipo "eu te disse, eu te disse, eu te disse". Vou ficar, cara, na tua Navilouca... me acomodei à Stultifera Navis. Mas não vou pular na correnteza como você. Fica para uma outra hora, valeu? Vou tentar dormir um pouco agora... A berceuse já até escolhi.. Espero que você me perdoe a obviedade, mas não resisti...

Cajuína
(Caetano Veloso)

Existirmos: a que será que se destina?
Pois quando tu me deste a rosa pequenina
Vi que és um homem lindo e que se acaso a sina
Do menino infeliz não se nos ilumina
Tampouco turva-se a lágrima nordestina
Apenas a matéria vida era tão fina
E éramos olharmo-nos intacta retina
A cajuína cristalina em Teresina



Em tempo: A puta da minha felicidade, que eu pensava que tinha ido dar uma volta na esquina com os amiguinhos dela sortudos em tudo, me ligou dizendo que está na fronteira com a Nicarágua. Está esperando a balsa pra ver se consegue asilo político em Cuba. Pode? Piraaaaaaaanha!
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