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15.7.07

Educação sentimental: estupre-me (ah Colbain, o que fizeste dessa geração?)


Não sei se estou mais para o flaubertiano Frederico Moreau, se para o enigmático e vampiresco Dalton Trevisan ("O que não me contam eu escuto atrás das portas. O que não sei, adivinho e, com sorte, você adivinha sempre o que, cedo ou tarde, acaba acontecendo.”) ou se para a fresquinha da Paula Toller; mas que ando tentando desesperadamente minha educação sentimental, isso é fato. Só sei que ultimamente venho construindo meus discursozinhos a partir de idéias que tentam assimilar um sem número de divagações que levam invariavelmente a um feixe de relações mitológicas, memorialísticas e psicológicas. Estou prenhe de mitos, memórias e psicologia barata. E isso, longe de me parecer uma riqueza, tem me deixado meio fora do ar. Não sei o que fazer de tudo isso. Há tanto o que dizer, caros leitores, e sinto que não sei por onde começar ou o que selecionar. É como se estivesse num espaço bem apertado, o in utero do Kurt Colbain, o cordão umbilical querendo me estrangular, os fórceps pressionando minha têmporas e eu no meio de muitas águas, querendo rasgar o ventre de minha mãe e vendo alguma luz no fim do túnel, onde sorrisos, lágrimas e aplausos me aguardam (Venha para a luz, Caroline!). Mas ao mesmo tempo que esse difícil parto é um rasgar de ventre e vagina maternos, é também um me rasgar. Se me exponho, me deixo rasgar, me estuprar.... Mas é isso aí, meu caro Colbain, i'm not the only one, rape me my friend, rape me again, hate me, do it and do it again, que eu pareço gostar e permitir que assim me invadam... De qualquer maneira, eu ando tão nervoso pra te escrever os versos mais profundos... ninguém vai resistir se eu usar os meus poderes para o mal... eu treino a tarde inteira o que é que eu vou falar, vai ser tão simples quanto eu vejo nas revistas... ninguém me explicopu na escola, ninguém vai me responder...


O que estou tentando dizer é que preciso pedir desculpas a vocês, caros leitores, pelos meus desvarios “umbiguistas” em recentes postagens, inclusive nesta aqui. Como está escrito acima, na descrição deste blog, “aqui vocês encontrarão considerações esparsas, algumas vezes sem nexo algum, a respeito desse meu caminhar: desabafos diários, poemas, notícias que li, trechos de livros que me tocaram”.... Certo é que ficou faltando um “etc” nessa enumeração, mas tão mais certo é que esse “etc” - e gostaria de deixar isso bem claro - que este “etc” não deveria ir, em hipótese alguma, até o delírio sentimental.


Assim sendo, faço aqui minha autocrítica, caros leitores. Aqui estou, de joelhos, a pedir-lhes clemência. Eu sei que não agi bem. Tinha o caminho reto à minha frente (ainda que “gauche”) e desviei-me. Me protegiam e me guardavam de todo mal os altíssimos desígnios deste blog e posterguei-os. Fui fraco, caprichoso, fútil e “umbiguista”. Fui enigmático, dúbio, inconseqüente e, sobretudo, incapaz de dirigir os meus esforços, a preciosa energia do meu intelecto, para a procura do bem comum. Revelei-me, em suma, lamentavelmente burguês. Por isso peço-lhes que me condenem já e com dureza, pois diante de tão horrendo crime qualquer pena será leve.
Sim, caros leitores, de cabeça baixa e mais corcunda do que já sou, eu admito: por mais que a palavra me queime os lábios ao pronunciá-la, eu fui um miserável traidor da sempiterna causa deste blog tão revoltadinho como se propunha no início. Que me venham as chibatadas, as masmorras infectas, o livrinho vermelho e as cuias de arroz mal cozido. Eu mereço isso tudo e muito mais.


Mea culpa, mea maxima culpa!



ALTA VOLTAGEM

Tudo plugado
Tudo me ardendo
Tá tudo assim queimando em mim
Como salva de fogos

(Adriana Calcanhoto)


Numa manhã cinza e inacabada
tudo ardeu em mim em segundos
E aquela presença absoluta
circulando em mim contínua
elétrica e indetectável
ricocheteando em minhas células
Como numa noite de São João
a vista turvou para o céu pontilhado
o cruzeiro de ponta a cabeça
inverteu a polaridade dos meus dias
e a festa acabou mais cedo...
Mas poeta cambaleante e fraco
ainda tentei em versos tímidos
seguir a procissão das horas restantes
visitando antigos altares
rememorando nos ex-votos
a carne trêmula e trigueira
que andava à mostra e nua
nos templos urbanos da luxúria
ora envolta em vapores de eucalipto
ora difusa pela fumaça e projetores...
Chegada a noite no entanto
não era mais uma metrópole a atravessar
mas a certeza do silêncio
da casa inabitada onde outrora
o tilintar de taças, o resvalar de corpos
davam a vã promessa de um longo caminho...
O copo d’água sobre o criado-mudo
repousa em prisma à meia-luz
antes de conduzir garganta abaixo
o milagre científico e único que
dissimula a contento essa ardência
sem contudo aniquilá-la...
De uma ponta a outra do meu corpo
em correntes de múltiplos ampères
assola-me paradoxal voltagem...
Só isolante achado da modernidade
protegerá incauto e ávido amante
a desafiar temerário e louco
a fulminância de minhas descargas.


(Edmilson BORRET)

12.7.07

Contra a maledicência e o sarcasmo, use a abundância de idéias, de amores e de risos

Então estive pensando que quando nada parece acontecer, é que coisas talvez estejam sub-repticiamente acontecendo. Quando pensamos haver uma aridez do caralho no campo das idéias, talvez o germezinho de uma puta idéia esteja se debatendo e se contorcendo justamente aí. Agora sigam meu raciocino: germe, campo... caralhos me mordam, fertilização!!!! Pois é, caros leitores, o tal germezinho fertilizou meu campo das idéias... engravidei! E como sempre fui/sou meio precoce em quase tudo, engravidei, gestei e pari.... tudo a um só tempo. Porque a grande sacação que me veio, na verdade, é que devo me forçar a ter idéias. Os lapsos deste blog estão cada vez maiores. Então apelei para a técnica da cornucópia (nada a ver com corno que trabalha com máquina de xerox, já vou logo avisando aos mais néscios!) para ter mais idéias para escrever. A partir de agora escreverei sobre tudo.... A cornucópia da abundância, segundo a lenda, é uma espiral que funciona assim: quanto mais usamos, mais riqueza vem. Na vida, isso também se aplica: aos ricos nada falta, tudo abunda. Como não sou rico de money, mas biliardário de idéias, resolvi delas fazer uso constante, só pra ver/sentir se algo em mim abunda... (caramba! adorei essa cacofonia... hehehehe)

A chave de tudo parece ser o humor. Porque o mau humor arrasta os pensamentos ralo abaixo, isso é uma verdade facilmente comprovável. E um sorriso sempre melhora tudo, gentileza gera gentileza e coisa e tal e aquele papo todo. A mais pura verdade, a gente sabe.
É que sempre se achou que o mau humor tivesse certo glamour filosófico... e até mesmo um certo charme... Pura cascata, caros leitores... Mau humor, pelo menos no campo das idéias, é uma praga. A partir do momento que resolvi cagar pro mau humor (mais uma vez, sigam meu raciocínio: cocô, o resultado da cagada, fertiliza tudo), parece-me que idéias começaram a brotar de todo canto. E cá estou para abrir esse imeeeeeenso parêntesis para discutir o impacto da extinção do mau humor e do sarcasmo para o meu ecossistema social e pessoal. Ah sim, outra praga a ser erradicada, não sem certa nostalgia, é a maledicência - esta é velha companheira, mas é fato que também nos arrasta à baixeza... Então passemos a freqüentar ambientes mais elevados: mosteiros no Himalaia, cumes nevados nos Andes, Machu Pichu ou até mesmo coberturas em Manhattan servem... mas há que se sair do rés-do-chão, do mesquinho e banal... freqüentar essas alturas onde todos parecem felizes e riem o tempo todo. Rico ri à toa, pode reparar. Os sábios também riem, embora mais discretamente. Estou treinando um riso búdico pra ver se abunda pro meu lado... (pausa para a foto)

Porque o grande segredo mesmo dessa porra toda é o seguinte, gente: se você não é feliz (pelo menos não como gostaria de ser), finja! Aja como se fosse, sorria muito, você perceberá como é fácil enganar os outros e até a si mesmo! Veja bem que esse é um segredinho de família que estou passando em primeira mão para vocês, caros leitores... E agora eu estou assim, quem nem besta, rindo à toa... Mesmo tendo um caminhão de motivos para estar puto da vida. Ok, ok, ok... Vocês não estão entendendo xongas do que estou falando com todo esse meu papinho risonho... É que estou cá pensando com meus botões (na verdade, velcro) se devo contar ou não... (pausa para eu pensar se vou contar mesmo)

Está bem, está bem... Mas vamos combinar assim: como boa celebridade que sou, eu não falo da minha vida pessoal... então vamos falar tudo de maneira genérica, ok?

Digamos assim que há algum tempo atrás eu andei meio no osso, na capa do Batman, como se diz... Mais para tiririca do brejo do que para flor do campo. A coisa estava “sinistra”, como diz a galera aqui da área onde moro: o financeiro, o emocional e, por conseguinte, a saúde, parece que tudo resolveu subir no telhado ao mesmo tempo... Mas vamos pular genericamente essa parte, porque o importante mesmo é entrar na tal lei da abundância. Porque o que vou dizer todo mundo sabe, e isso é fato, então volto a falar em termos genéricos: quando a gente está em fase encalhada, nem os mendigos olham quando a gente passa. Mas quando arranja alguém, é batata: todos os ex-futuros-casos, ficantes eventuais, potenciais e congêneres resolvem lembrar da sua existência, aparecer, telefonar, e até se materializar do nada, por acaso, no meio do seu caminho. Nada garante que, dentre estes, esteja o amor de sua vida, mas as chances aumentam muito... hehehehe... E da mesma maneira que se pode aplicar a lei da abundância e da cornucópia no campo das idéias, o mesmo se pode fazer no campo dos encontros...

Mas aí, vocês lembram das três pragas de que falei que impedem qualquer coisa de fertilizar e germinar? Sim, o mau humor, o sarcasmo e a maledicência.... Bem, o mau humor rolava por minha conta mesmo, no tempo em que eu não sabia fingir. O sarcasmo e a maledicência vinham dos olhos da vizinhança aqui da rua. Já haviam até mesmo decretado minha morte por antecedência. Tornei-me, aos olhos da massa ignara, colheita maldita 1, 2 e 3 e todas as continuações e refilmagens possíveis e imagináveis. Se fuderam de verde e amarelo!!!! Estou mais firme que nunca.

O que posso revelar genericamente aos leitores de Caras (ops, deste blog) é que, ao que parece, os olhos maledicentes agora me perscrutam por conta do meu riso à toa e dos meus muitos encontros. Como a maldição-do-fim-do-século dos tempos das vacas magras não se confirmou, os boçais agora andam espantados com a minha cornucópia.... Só sei que estou rindo de orelha a orelha e cagando e andando para esses infelizes.... E só fertilizando os campos (tanto das idéias quanto dos encontros) por onde ando.

Mas vejam bem: tudo isso que eu disse aqui, foi assim genericamente falando, ok? Não está mais aqui quem falou... hehehehe

Bjs e abraços felizes do Ed!

25.6.07

De casamento, de separação & de solidão


Pois é, minha amiga. Outro dia falávamos sobre solidão e nos magoávamos. Entretanto, eu podia perceber que você me compreendia ainda assim. Ah, as impossibilidades de algumas relações!!! A gente se mascara, não?! Depois, você me perguntou: "Na sua opinião, o casamento pode dar certo?" Não lhe respondi de imediato... Eis-me aqui então.

Já que vamos falar de solidão, devo lhe dizer que não entendo nada do assunto. Eu a trago em mim, sinto-a em mim, mas dela não entendo nada... da mesma forma que nada entendo de casamento. O que eu poderia falar? Você desdenhou e riu de mim por nunca tê-lo vivenciado. Mas será realmente necessário tê-lo vivido para falar disso? – fico aqui me perguntando... Ok, então. Falemos de relação antes de tudo! O casamento sendo apenas umas dessas possíveis relações, e não "A Relação".

O que é uma relação entre duas pessoas? Eu costumo chamá-la de "um desvio". Uma forma de se fazer um desvio para escapar ao caminho inequívoco da solidão. Somos todos seres solitários, isso é uma verdade inescapável. Faz parte da natureza humana. Portamos em nós uma solidão inata. Aliás, nos dois momentos limites de nossa terrena existência, estamos total e completamente sós: ao nascer, nascemos sós; ao morrer, morremos sós. Entre esses dois momentos, o que fazemos nada mais é do que disfarçar essa condição natural do homem. O casal, a tal cara-metade, é o disfarce por excelência de toda essa porra. Com freqüência, esperamos que o outro preencha o vazio de nossa existência. A gente diz "eu te amo" e isso já é uma puta responsabilidade para o outro. Puta que pariu! Que carga de responsabilidade jogamos nas costas do outro quando lhe dizemos um simples (porém necessário, veja bem!) "eu te amo"!!!! E vice-versa... Assumimos responsabilidades para com o outro que, no fundo, seriam responsabilidades para com nós mesmos. "Tudo bem, eu te acolho, eu te abrigo" – dizemos com freqüência. Quando na verdade, gostaríamos de dizer:"Acolha-me, abriga-me!"

É preciso ter muito colhão para aceitarmos nossa solidão, minha amiga! É preciso saber que o casal não é uma solução, um fim – mas um meio. O tal do amor sempiterno não existe, ok? Ah sim, e aquele e-foram-felizes-para-sempre também não existe, ok? Sinto informar que não lhe contaram toda a estória. Que parte do "era uma vez" que você não entendeu? Voltando, porém, à sua pergunta: sim, sem dúvida alguma o casamento pode ser algo que dê certo. Se assim não fosse, ele não teria razão de existir, oras! O que as pessoas insistem em fazer, no entanto, é tentar conferir ao casamento esse status de mutualidade tanto da felicidade quanto da infelicidade. Pela mãe do guarda, minha querida! Não quero ser um estraga prazeres, mas felicidade ou infelicidade são estados d’alma próprios ao indivíduo (a própria etimologia da palavra já dá conta disso: "indivíduo" = indivisível, único, só). Só dele, de mais ninguém. Como compartilhar esses sentimentos? A gente compartilha cama, escovas de dentes, dívidas, momentos, sensações e uma pá de outras coisas numa relação. Mas não venha me dizer que sentimentos são compartilhados... na boa. No casal, no casamento como queira enfim, temos quando muito duas liberdades que vão assumir o compromisso de se descobrirem, se enfrentarem, se respeitarem e talvez se ampliarem. E também (calma! não me voe no meu pescoço ainda não, minha amiga!) o desejo!!! É... às vezes o desejo também se volta para um objeto fora do casal... E aí? E aí que o casal não dá conta disso. Que pretensão querer achar que pode dar!!!! Como eu falei, o objeto do desejo instalou-se fora do casal. A parte envolvida e interessada do casal que vá lá e resolva. E volte ou não. E pronto!

Se aceitarmos a idéia de casal como passagem, como meio, como conhecimento do outro (no fundo, conhecimento de nós mesmos, já que não conhecemos ninguém além de nós mesmos... às vezes nem isso), e não como complementação um do outro, como compartilhamento - é bem possível que o casamento torne-se algo mais cool, mais leve. Além do mais, a gente se caga de medo mesmo não é do fracasso do casamento, mas da possível solidão que disso possa advir. Mas porra, se nos reconhecermos como seres solitários por excelência, se não considerarmos o casamento, o casal, como a solução para essa solidão... caramba! por que pirar tanto nessa batatinha???!!!! É muito mais fácil suportar a solidão depois de uma separação quando a gente se dá conta de que ela sempre esteve presente. Ela nunca se foi. Que dor e que maravilha quando a gente percebe isso! A gente se sente frágil, mas estranhamente forte ao mesmo tempo. A gente sabe que perdeu algo, mas em contrapartida, sabe também que ganhou. A gente ganhou. O quê? A paz. E isso é tudo. A paz que advém do entendimento das coisas, do entendimento de si próprio. "Gnoti seautón", conhece-te a ti mesmo: está lá no pórtico do templo a Apolo, em Delfos. Conhecimento é poder, minha querida! Se você conhece o seu mal, se você lhe retira a máscara, você o domina.

Se o casamento pode dar certo, você me pergunta? É óbvio que pode. Da mesma forma que a separação também pode. Cabe a nós possibilitar isso. Vamos para a vida, minha amiga, vamos para a vida!


Cada aeroporto
É um nome num papel
Um mesmo rosto
Atrás do mesmo véu
Alguém me espera
E adivinha no céu
Que meu novo nome é
Um estranho que me quer
E eu quero tudo
No próximo hotel
Por mar, por terra
Ou via Embratel
Ela é um satélite
E só quer me amar
Mas não há promessas, não
É só um novo lugar

Viver é bom
Nas curvas da estrada
Solidão, que nada
Viver é bom
Partida e chegada
Solidão, que nada

Ela é um satélite
E só quer me amar
Mas não há promessas, não
É só um novo lugar

(Cazuza)

18.6.07

Le Bal... et hier encore j'avais vingt ans



C'était l'an 1989, j'allais sur mes 22 ans. À la fac des Lettres, le prof de français nous avait fait voir le film pour la première fois. C'était Le Bal, d'Ettore Scola, de 1983. Étonnement général! Tous les étudiants muets, comme les personnages du film. Lèvres cousues ou bouches béantes, voilà les deux opposés d'une même réaction de stupéfaction et d'émerveillement face aux images qui défilaient devant nos yeux. Aucun mot, aucun dialogue, et 50 ans de l'histoire de France se déroulaient dans presque deux heures de film. Il me fallait écrire quelque chose après la séance. Ça a toujours été comme ça: quand quelque chose me touche, il faut que j'écrive.
Alors, les amis, le texte suivant est un texte de jeunesse. Veuillez excuser ce qu'il puisse avoir de niais. En effet, il s'agit de l'ardeur propre aux jeunes. En rangeant mes anciens papiers, j'ai décidé de fouiller les caves de mes mémoires. Et voilà que ce texte en est sorti. Mais attention, les amis! On parcourt pas impunément le terrain des mémoires. Les larmes sont venues à mes yeux en lisant ces textes d'auparavant. Tant de choses vécues... Ça voulait dire on a vingt ans... On était jeunes, on était fous...



Le Bal

Eh bien, me voilà de nouveau! Ça recommence. Le salon est déjà nettoyé, rangé, éclairé. Les rangs des tables patiemment disposées des deux côtés du salon. Il faut faire le même avec les verres, les bouteilles... La vie, l’âme, le monde, rien n’est forcément en ordre mais, le salon, au moins le salon, il faut qu’il le soit. Ranger le dehors pour avoir l’impression d’avoir rangé le dedans. D’où vient qu’on doit s’y attacher ? Je sais pas. C’est tout de même une vraie responsabilité la mienne, voire un pouvoir ! Leur donner cette frêle et débile apparence d’organisation. Combien ça me coûte toutefois ! C’est à moi la réussite aussi bien que l’échec de leurs espoirs. Car au bal, comme dans la vie, il n’y a jamais de demi-mesures : c’est tout ou rien. Et moi au beau milieu. Qu’espèrent-ils de moi ? J’en ai déjà assez de remplir leurs espaces entre le souhaité et le vécu. Je n’arrive même pas à me souvenir de mon premier bal. Je peux cependant assurer à qui veut le croire que dès ce moment-là je savais déjà ce que je serais à jamais : le ménager des rêves d’autrui. Qu’est-ce qu’ils attendent, ces gens ? Qu’est-ce que j’attends, moi ? Et voilà qu’elles arrivent. Elles arrivent toujours le premier, les femmes. Au moins là, au bal – il faut le ramarquer ! Toujours la même scène. La descente des escaliers, droite, assurée. Un défilé jusqu’au fond du salon pour vérifier dans le miroir si le dehors est en ordre. Le masque retouché, l’armure étincelante, à la bataille ! Allons les dames de la Patrie ! Marchons, marchons ! Elles attendent en harmonie avec la musique, toujours la même... J’attendrai le jour et la nuit, le tourne-disque crie. Elles attendent toutes. En se regardant, en se comparant peut-être. Laquelle est la plus belle ? Si chacune pouvait deviner le dedans les unes des autres, elles en seraient sûrement toutes la même et une seule. Elles seraient moi. Moi, je serais elles. Ou peut-être eux qui viennent d’arriver, les hommes. Le même rituel : la descente, le défilé. La comédie commence. Les femmes assises aux tables. Les hommes debout au comptoir. Elles ne se font pas du tout par hasard ces positions marquées comme dans un tableau ou dans une mise en scène. Comme ça on peut remarquer ce qui est offert et demandé dans les particularités de chaque côté. C’est tout comme un jeu. Un jeu d’échanges. Un jeu d’encaissement. D’un côté la proie ; de l’autre, le chasseur. Sans qu’on sache assez bien qui joue quel rôle. De toute façon, il faut participer au jeu. Mais qui commence ? Et maintenant, que vais-je faire? On se demande sans attendre une réponse quelconque. De tout ce temps que sera ma vie ? De tout ce petit bout de temps qu’est le bal. De toute cette immensité de temps qu’est ma vie. De tous ces gens qui m’indiffèrent et qui m’attirent le regard à la fois. Mademoiselle, il y a longtemps que je vous regarde. Pourrions-nous peut-être ouvrir la danse ? Qu’en pensez-vous ? Mesdemoiselles, il y a déjà bien un demi-siècle que je vous regarde. Messieurs, il y a déjà bien un demi-siècle que je me moque de vous. En tous cas, dansons joue contre joue. J’ai déjà gardé vos rubans rouges lors de vos premiers congés payés. Je vous ai déjà servi ein Bier ou einen Wein. Je vous ai déjà cueilli des fleurs d’un printemps pas tellement calme, bien que partout on dise que tout ce dont on avait besoin c’était l’amour – tu te rappelles, Michelle ? J’ai déjà vu tant de choses dans ce salon que je ne m’excuserais pas de me placer au-dessus de tout cela, de vous tous. Vous êtes les mêmes depuis longtemps. Il ne change que votre musique et vos pas. Valse, tango, twist, bebop, biguine, blues, boston, cakewalk, charleston, fox-trot, java, jerk, marche, mambo, one-step, paso doble, rock, rumba, samba, slow fox, swing, disco – je les ai vus tous, dansés tous. Et je ne me sens pas du tout vieux quand même. C’est pas moi qui vieillis. Ce sont les rythmes qui changent. C’est le dieu du temps qui vieillit. Moi, je m’en moque. Autrement vous n’existeriez pas. C’est moi qui vous donne vos dehors, messieurs-dames. Les guerres, les vagues, les danses s’en vont. Moi, mon salon, mes boissons – votre scotch, madame – moi, je continue. Pendant que vous accomplissez votre drôle d’accouplement, j’attends. Comme d’ailleurs j’ai toujours attendu. Et j’attendrai...

(Edmilson BORRET - 1989)











Pour apprendre davantage sur le film, cliquez ici.

15.6.07

Sobre meninos, peraltagens e poesia... Manoel de Barros


Nascido em 1916, em Cuiabá, Mato Grosso, e depois de cursar Direito na capital do Rio de Janeiro, publicar alguns livros e já receber prêmios por eles, a partir de 1960 Manoel de Barros recolhe-se em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, para trabalhar como fazendeiro e criador de gado. Mas não abandonou o seu fazer poético a partir daí. Ele é, sem dúvida alguma, um dos principais poetas contemporâneos do Brasil. Em sua obra, segundo a crítica Berta Waldman, "a eleição da pobreza, dos objetos que não têm valor de troca, dos homens desligados da produção (loucos, andarilhos, vagabundos, idiotas de estrada), formam um conjunto residual que é a sobra da sociedade capitalista; o que ela põe de lado, o poeta incorpora, trocando os sinais".
Manoel de Barros, num dos seus poemas mais conhecido, nos fala do ato fazer poesia como se fosse o mesmo que carregar água em uma peneira. Para ele a poesia é uma criação que, no parco entender dos mais desavisados e menos sensíveis, não teria uma finalidade prática e objetiva, algo sem valor palpável ou mensurável. Entretanto, fazer poesia, para ele, seria também “montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos”, ou seja, seria trabalhar com uma lógica que, não raro, estaria para além do rotineiro e do previsível; seria olhar a realidade do mundo por uma ótica nem sempre objetiva. Fazer poesia é fazer “peraltagens” com as palavras, arrumá-las como quem cria um mundo particular capaz de produzir inexplicáveis efeitos em que lê. A poesia, aliás como toda a literatura, é a arte da palavra – sua essência sendo necessariamente um trabalho com a linguagem esteticamente organizada de forma a buscar a expressão e a comunicação universais.



O menino que carregava água na peneira

Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.

A mãe disse que carregar água na peneira
era o mesmo que roubar um vento e sair
correndo com ele para mostrar aos irmãos.

A mãe disse que era o mesmo que
catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.

O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores
e até infinitos.

Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira

Com o tempo descobriu que escrever seria
o mesmo que carregar água na peneira.

No escrever o menino viu
que era capaz de ser
noviça, monge ou mendigo
ao mesmo tempo.

O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.

Foi capaz de interromper o voo de um pássaro
botando ponto final na frase.

Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.

O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor!
A mãe reparava o menino com ternura.

A mãe falou:
Meu filho você vai ser poeta.
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os
vazios com as suas
peraltagens
e algumas pessoas
vão te amar por seus
despropósitos

(Manoel de Barros)

7.6.07

Nós, os poetas, erramos...

Sim, nós, os poetas, erramos... Isso é uma verdade mais do que sabida desde a antigüidade até os dias atuais. Falseamos a realidade, tombamos a beleza lá das Idéias aqui para as sombras, já dizia Platão, tentando escapar da caverna... Fingimos tão completamente que chegamos a fingir ser dor a dor verdadeira, cantava Pessoa... E, por sermos poetas, não aprendemos a amar, arremataria Cazuza em suprema clarividência...

Mas gosto muito da explicação de Lamartine Babo para o nosso erro... por rimarmos "os nossos olhos nos olhos de alguém que não vem"... E a isso, eufemisticamente, passamos a chamar de licença poética... Mas tudo bem. Segundo o próprio Lamartine, "Jesus não castiga o poeta que erra"... Menos mal... Esse Jesus deve ser um camarada legal... Com toda certeza, deve ter sido poeta também... Aliás, eu prefiro acreditar que sim. Pois isso faz dele um sujeito bem mais interessante, passível de erros, de carne e osso como eu, chapa mesmo... Assim como Pessoa, "estou farto de semi-deuses"... ou de deuses...

Mas voltando à música do Lamartine, ela tem uma história bem interessante mesmo. A história é meio sui generis e dá conta dos erros e enganos próprios dos poetas. Não sei quanto de mito vai aí, mas diz-se que lá pelos idos dos anos 30, o teatrólogo e escritor Carlos Alves Neto quis formar um álbum , colecionando fotos de artistas do rádio, já que a maior diversão da época era ouvi-los. Passou, então, a escrever para os cantores, pedindo-lhes fotografias para sua coleção, sendo algumas vezes atendido e outras não. Percebendo que a maioria dos artistas que não respondia a suas cartas eram os homens, resolveu a adotar um nome de mulher para, enfim, alcançar seu objetivo. Passou, então, a usar o nome de Nair, sua pequena sobrinha, nas correspondências; inclusive nas enviadas para Lamartine Babo, pois daquela forma esperava conseguir a foto do artista, que despontava como ídolo no cenário nacional. Contam que Lamartine Babo sentia-se um homem solitário e tinha um enorme complexo de feiúra e, talvez por isso, ao invés de mandar a foto pedida, limitava-se em responder às cartas enviadas por Nair, sempre com pedido de que continuasse a escrever-lhe para suprir-lhe a solidão. Demonstrava, a cada dia, mais e mais afeição pela admiradora. Carlos Alves Neto até pensava em contar-lhe a verdade, mas isso só poderia acontecer se a foto fosse enviada. E finalmente, o tão sonhado presente para a sua coleção chegou. Deveria, então, acabar com a brincadeira que tomava proporções cada vez maiores. A idéia foi escrever relatando que Nair havia se casado. Porém, foi o próprio Carlos Alves Neto quem convidou o famoso "Lalá" para visitar a cidade, quando estaria lançando "Os Tangarás" , grupo musical que mostrou talento por vários anos. Imaginava que, naquela ocasião, pudesse contar-lhe toda a verdade sobre a história de Nair. Lamartine aceitou o convite e ansioso para conhecer a "sua Nair", foi recebido pelo grupo de rapazes liderados por Carlos Alves Neto, mas com a promessa de que seria-lhe apresentada a admiradora no baile. Naquela oportunidade, tudo seria esclarecido. No entanto durante a festa, uma moça que dançava com Lamartine adiantou-se e contou-lhe toda a história. A decepção, falam, mostrava-se evidente na fisionomia do compositor. Mas não tão grande a ponto de ficar zangado com Carlos Alves Neto, amigo que o recebeu outras tantas vezes em Boa Esperança. O que importa mesmo é a bela canção que nasceu desse equívoco. Uma das suas mais belas composições, gravada por diversos intérpretes e até hoje tocada pelos modernos, o inspiradíssimo samba-canção "Serra da Boa Esperança" mostrou-se propício a interpretações que vão do clássico (Orlando Silva, Sílvio Caldas, Altemar Dutra, Elizeth Cardoso, Jacob do Bandolim, etc) ao inovador; especialmente com criativas mudanças harmônicas, como a versão instrumental que lhe deram César Camargo Mariano e Wagner Tiso, em 1983, e a vocal de Eduardo Dusek, em 1984, num reverente e belo resgate.

Com letra e música de Lamartine, "Serra da Boa Esperança" é um exemplo bem expressivo de sua arte, em que o poeta e o compositor se igualam em competência e bom gosto... apesar do equívoco original... Mas tudo bem, Jesus-poeta perdoa...


(Cidade de Boa Esperança, sul de Minas Gerais... a serra lá ao fundo)


Serra da Boa Esperança
(Lamartine Babo)

Serra da Boa Esperança esperança que encerra
No coração do Brasil um punhado de terra
No coração de quem vai, no coração de quem vem
Serra da Boa Esperança meu último bem
Parto levando saudades, saudades deixando
Murchas caídas na serra lá perto de Deus
Oh minha serra eis a hora do adeus vou me embora
Deixo a luz do olhar no teu luar
Adeus

Levo na minha cantiga a imagem da serra
Sei que Jesus não castiga o poeta que erra
Nós os poetas erramos, porque rimamos também
Os nossos olhos nos olhos de alguém que não vem
Serra da Boa Esperança não tenhas receio
Hei de guardar tua imagem com a graça de Deus
Oh minha serra eis a hora do adeus vou me embora
Deixo a luz do olhar no teu luar
Adeus

5.6.07

Acionar o "foda-se" exige bem menos do que imaginamos



Aqueles que me conhecem bem sabem que, há muito tempo, acionei o botão "liga o foda-se e seja feliz". Revoltadinho eu? Iconoclasta? Irresponsável? Talvez sim, talvez não... De qualquer maneira, acionar o "foda-se" tem sido um puta exercício de sobrevivência...

Um belo dia você acorda e se dá conta de que nem todos aqueles sonhos faziam sentido, que a porta emperrou, que a porra do telefone não vai tocar. E fica aí, na expectativa de que as coisas mudem, mas nada acontece. E daí? Foda-se!
Um belo dia você acorda e não sabe mais qual o seu papel nesse mondo cane. Aí você sai do trabalho, senta a bunda numa cadeira de bar e decide resolver o mundo. E acredita piamente que vai conseguir... tsc tsc tsc tsc tsc... Desista, amigo! O mundo tem suas próprias engrenagens... E posso jurar que uma ou mais de uma dessas engrenagens produz um som repetido e sarcástico, como um mantra bem sacana a ecoar: "Foda-se... foda-se... foda-se..."
E no final do dia, ainda atônito, você ajeita o travesseiro, sente seus pés formigando, fecha os olhos para tentar entender o propósito disso tudo...até que o novo dia venha e você perceba que suas dores, dúvidas e dívidas continuam ali... Desistir de tudo? Lógico que não. Liga o "foda-se", amigo!

Sabe aquelas pequenas coisas que te irritam, tiram você do prumo e você, muito dificilmente, tem como evitar? Foda-se pra elas!
Comportamento inesperado e injusto das pessoas que te rodeiam? Fossa por conta dos acontecimentos infelizes da vida? Preocupações demasiadas? Puto por ter levado a culpa por algo que não fez, papagaiao comeu milho e você levou a fama? O leite ferveu e entornou? O pneu furou? O chuveiro queimou? A mulher fugiu com outro? O pau broxou justo naquele momento em que não poderia de maneira nenhuma?
Pois bem...pra isso tudo eu ando dizendo: "Foda-se!!!"

Tentei explicar repetidas vezes, a pessoa não se deu ao trabalho de querer entender? Foda-se!
Pensei que o filho-da-puta era meu amigo, mas me passou a perna? Foda-se!
Os merdinhas que me cercam são um bandinho de hipócritas? Foda-se!
Há coisas que nós, sinceramente, não podemos modificar. Então, ficar batendo cabeça pra quê?! Sofrer pra quê?!

Por essas e por outras que eu ando acionando o "foda-se" sempre que possível! É um maravilhoso exercício mental! Experimente você também!


Mundo Cruel
(José Miguel Wisnik)

Desce desse galho em que te escondes
Sai desse céu sem ninguém
Onde não vês luz nem horizontes
Onde não vês nada além
Pára de ficar rolando tempo
Lamentando e alimentando dentro
A ferida do tormento
Também sei a dor de que te poupas
Sim, o mundo é cruel
Mas eu te pergunto, com que roupas
Vais contracenar o teu papel?
Pára de ficar rolando o tempo...
Da cilada má, da trama e a rede
Que o destino armou pra ti
Tu fizeste a cama, o colchão e a parede
Do teu próprio quarto de dormir
Pára de ficar rolando o tempo...
Já não há o que, de que, com que
Que te resguarde
Joga a tua carta, enfim
Antes do acaso arder, antes que tarde
Antes do verão ter fim
Não vou prosseguir nesta toada
Não vou insistir, dizer mais nada
Deixe que te diga o vento
Pára de ficar rolando o tempo...


Em tempo: Se chiar resolvesse, sal de fruta não morria afogado.

26.5.07

Respeito muito minhas lágrimas, mas ainda mais minha risada




engraçado como um verso que cantei várias vezes de repente assume, neste meu momento, um significado quase visceral... alegria não existe sem tristeza, dor não existe sem felicidade... da mesma maneira que silêncio não existe sem som, nem sombra sem luz...

meu amigo, há dias para sonhar, e tantos outros para entender... há dias para planejar, e tantos outros para empreender... dias para ganhar, outros para perder... dias para desistir, virar as costas e desistir da vida, e tantos outros para amá-la com todas as forças... há dias para se recolher, negar e se distanciar, dias de ausência e de saudade, e outros tantos para acordar e começar tudo de novo... e em todos esses dias, nós... nós, de posse de nossos coraçõezinhos imbatíveis e corajosos... e olha, meu amigo, que eu entendo bem de lágrimas, daquelas lágrimas que transbordam, escorrem, e rolam pelo rosto doendo feito queimadura... eu entendo bem de lágrimas, furtivas ou não... mas também entendo de alegria... e isso na mesma e exata proporção...

pois é, meu amigo, eu com meus cansaços e com minha vontade às vezes louca de fugir e só voltar depois de muito, muito tempo, acho que andei também meio deprimido, triste cansado, doente, irado e com medo... não sei ao certo... mas ela estava sempre ali: a calada e teimosa esperança... e aí eu decidi que vou voltar a sorrir... e isso é mais que um desejo, é uma escolha... é uma decisão inadiável...

um velho índio norte-americano descreveu certa vez seus conflitos internos: “dentro de mim existem dois lobos, um deles é cruel e mau, o outro é muito bom; os dois estão sempre brigando”... quando então lhe perguntaram qual dos lobos ganharia a briga, o sábio índio parou, refletiu e respondeu: “aquele que eu alimento”...

não estaria na hora, meu amigo, de pararmos de alimentar o lobo malvado que habita em nós? não estaria ele matando nossa risada? believe me, my friend, pode levar um certo tempo, pode até custar algumas conquistas ou mesmo a segurança e tranqüilidade de relacionamentos que se acreditavam perenes, mas é preciso voltar a sorrir como antes... a mim me foi preciso apenas um período de descanso para que eu percebesse a falta que me fazem os meus sorrisos... e como é bom vê-los de novo se refletindo no rosto dos amigos e colegas... uma coisa te digo, meu amigo, from this moment on, com a destreza que me foi dada, me tornarei perito em risadas...

e se você, meu amigo, ainda não pôde compreender as razões desse verso de “Vaca Profana” intitulando esta postagem, sugiro que escute de novo a música, que preste atenção aos versos e tente perceber, na gradação a que eles induzem, a associação que fiz, ao pensar nos meus momentos de antes, no seu momento de agora (fora o “leite mau”!!!), evoluírem através do nosso controle, escolha e decisão (“movida madrileña ...”) para devolverem às nossas vidas, em lucros (leite bom), os custos da existência... mas não se avexe não, amigo, amanhã tudo pode acontecer... inclusive nada... e além do mais, como diz a música: “de perto, ninguém é normal”...

um brinde às lágrimas que passaram e às que virão... mas, na boa, eu respeito muito mais a minha risada...




FELICIDADE REALISTA
(Martha Medeiros)


A princípio, bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável, mas nossos desejos são ainda mais complexos.

Não basta que a gente esteja sem febre: queremos, além de saúde, ser magérrimos, sarados, irresistíveis.

Dinheiro? Não basta termos para pagar o aluguel, a comida e o cinema: queremos a piscina olímpica e uma temporada num spa cinco estrelas.

E quanto ao amor? Ah, o amor... não basta termos alguém com quem podemos conversar, dividir uma pizza e fazer sexo de vez em quando.

Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo. Queremos estar visceralmente apaixonados, queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados, queremos jantar à luz de velas de segunda a domingo, queremos sexo selvagem e diário, queremos ser felizes assim e não de outro jeito.

É o que dá ver tanta televisão. Simplesmente esquecemos de tentar ser felizes de uma forma mais realista.

Ter um parceiro constante, pode ou não, ser sinônimo de felicidade. Você pode ser feliz solteiro, feliz com uns romances ocasionais, feliz com um parceiro, feliz sem nenhum.

Não existe amor minúsculo, principalmente quando se trata de amor-próprio.

Dinheiro é uma benção. Quem tem, precisa aproveitá-lo, gastá-lo, usufruí-lo. Não perder tempo juntando, juntando, juntando. Apenas o suficiente para se sentir seguro, mas não aprisionado. E se a gente tem pouco, é com este pouco que vai tentar segurar a onda, buscando coisas que saiam de graça, como um pouco de humor, um pouco de fé e um pouco de criatividade.

Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável.

Fazer exercícios sem almejar passarelas, trabalhar sem almejar o estrelato, amar sem almejar o eterno. Olhe para o relógio: hora de acordar. É importante pensar-se ao extremo, buscar lá dentro o que nos mobiliza, instiga e conduz mas sem exigir-se desumanamente.

A vida não é um jogo onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio. Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. Se a meta está alta demais, reduza-a. Se você não está de acordo com as regras, demita-se. Invente seu próprio jogo. Faça o que for necessário para ser feliz. Mas não se esqueça que a felicidade é um sentimento simples, você pode encontrá-la e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade.

Ela transmite paz e não sentimentos fortes, que nos atormentam e provocam inquietude no nosso coração. Isso pode ser alegria, paixão, entusiasmo, mas não felicidade...

"O tempo não pára! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo..."

10.5.07

Saravah ! Un peu du Brésil pour les amis français

Je songe avant tout à mes amis français, déshérités et malhereux en ce moment "sarkozyen". C’est pourquoi je leur fait ce cadeau pour alléger leurs maux en espérant que leurs coeurs ulcérés se soulageront un peu, parce qu’il faut toujours espérer en des temps meilleurs... Voici un peu de la poésie, de la culture, de la musique et de l’esprit brésiliens pour eux !

S’étant passionné pour le Brésil et pour sa musique, en tant qu’ami de Baden Powell, Pierre Barouch avait chanté un morceau de la chanson "Samba da Benção", de Baden e Vinícius de Moraes, dans le film Un homme, Une femme (1966), de Claude Lelouch, si bien qu’il a contribué à la popularisation de la musique brésilienne en France. Trois ans après il débarquerait au Brésil pour tourner le documentaire Saravah ("Samba da Benção" était devenu "Samba Saravah" dans le film de Lelouch). Ce documentaire je ne l’ai pas encore, je viens de le commander. Voici pourtant la scène du film de 1966 où la chanson de Baden e Vinícius a été chantée pour la première fois en français... Pour les brésiliens qui sont en France en ce moment, je crois que ce sera de la pure nostalgie... Saravah ! Ça (ra) va!

Samba Saravah
(Vinícius de Moraes e Baden Powell – version : Pierre Barouh)

Etre heureux, c'est plus ou moins ce qu'on cherche,
J'aime rire, chanter et je n'empêche
Pas les gens qui sont bien d'être joyeux.
Pourtant, s'il est une samba sans tristesse,
C'est un vin qui ne donne pas l'ivresse;
Un vin qui ne donne pas l'ivresse,
Non, ce n'est pas la samba que je veux.

J'en connais que la chanson incommode,
D'autres pour qui ce n'est rien qu'une mode,
D'autres qui en profitent sans l'aimer.
Moi, je l'aime et j'ai parcouru le monde,
En cherchant ses racines vagabondes;
Aujourd'hui, pour trouver les plus profondes,
C'est la samba-chanson qu'il faut chanter.

On m'a dit qu'elle venait de Bahia,
Qu'elle doit son rythme et sa poésie
À des siècles de danse et de douleur.
Mais quel que soit le sentiment qu'elle exprime,
Elle est blanche de formes et de rimes,
Blanche de formes et de rimes,
Elle est nègre, bien nègre, dans son coeur.




Estou pensando, antes de tudo, nos meus amigos franceses, deserdados e infelizes nesse momento "sarkoziano". E é por isso que lhes faço esse pequeno mimo como consolo das dores na intenção de que seus coraçõzinhos feridos se aliviem um pouco, pois é preciso que se espere sempre por dias melhores... Eis aqui um pouco da poesia, da cultura, da música e do espírito brasileiros para eles!

Apaixonado pelo país e por sua música e amigo de Baden Powell, Barouh cantou um trecho em francês da música "Samba da Bênção", de Baden e Vivícius de Moraes, na trilha sonora do filme
Um Homem, Uma Mulher (1966), de Claude Lelouch, contribuindo para a popularização da música brasileira na França. Três anos depois, o ator gravou no Brasil o documentário Saravah ("Samba da Bênção" havia se tornado "Samba Saravah" na trilha do filme). Ainda não tenho esse documentário, acabo de encomendá-lo; mas aqui está a cena do filme de 1966 em que a música de Baden e Vinícius foi cantada pela primeira vez em francês.... Para os brasileiros que estão na França nesse momento, acho que será nostalgia pura... Saravá!

Samba da benção

(Vinícius de Moraes e Baden Powell)


É melhor ser alegre que ser triste

Alegria é a melhor coisa que existe

É assim como a luz no coração


Mas pra fazer um samba com beleza

É preciso um bocado de tristeza

É preciso um bocado de tristeza

Senão, não se faz um samba não


Fazer samba não é contar piada

E quem faz samba assim não é de nada

O bom samba é uma forma de oração


Porque o samba é a tristeza que balança

E a tristeza tem sempre uma esperança

A tristeza tem sempre uma esperança

De um dia não ser mais triste não


Ponha um pouco de amor numa cadência

E vai ver que ninguém no mundo vence

A beleza que tem um samba, não


Porque o samba nasceu lá na Bahia

E se hoje ele é branco na poesia

Se hoje ele é branco na poesia

Ele é negro demais no coração

8.5.07

Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Altair Malacarne...

... A criar confusões de prosódia e um profusão de paródias que encurtem dores...


E criem sabores. Sabores capixabas. Sabores de Altair, o nosso Alta. Altair tem verve. Altair tem verbo. E por tê-lo, tem orações exatas e pias. Altair escreve bem como ninguém. Altair é alegria dos amigos. E delicioso de ler e ouvir. Altair é histórias. Altair acarinha a língua como quem possui uma mulher. Mais do que língua-mãe, faz dela esposa, irmã, filha e concubina.

Num gesto da mais desavergonhada tietagem, criei uma comunidade para o Altair no orkut. Altair e suas "romildas" surgiu da necessidade de render homenagem a esse malabarista das palavras. As suas "romildas" (mais do que a puta Romilda que o desvirginou) nada mais são do que isso: as suas histórias. As histórias que o penetraram, o atravessaram e, de certa forma, o desvirginaram também quotidianamente. Filho de agricultores capixabas, resultado da cruza de italianos com portugueses, negros e índios, esse grande homem muito nos tem a contar. De São Domingos do Norte a São Gabriel da Palha, da entrada no seminário ao acidente vascular cerebral, tudo parece ter impregnado de profunda e triste beleza essa alma de muitas vivências e outras tantas querências.

Altair e sua língua é irreverência. Altair dá língua para a língua. Altair lambe a língua. Feito gata e sua cria. Altair fala de "paus" e "bucetas" como se de conectivos lingüísticos falasse. Elos que são. Mais que "paus" e "bucetas" são anafóricos que pegam de trás. Catafóricos que lançam à frente. Altair é usuário e abusário da língua. Altair tem a língua da mata, dos bichos, dos homens... Poderia passar horas falando de Altair. E não conseguiria dizer nada. Altair não cabe nas minhas palavras. Quisera um dia eu encontrasse Altair e pudesse abraçá-lo. Só isso: abraçá-lo. Sem mediação de palavaras. Que nessa hora palavara dita de certo atrapalha. Seria melhor palavra tátil. Gustativa. E eu ia gostar de sentir a minha língua roçar na língua malacarniana.

Hoje Altair escreveu. Li. Gostei.


Quando cheguei no seminário, fui brincar com os ostros meninos no pátio. No corre-corre, gritei: "PEGA ÊLI!"
Todo mundo me olhou e riu.
-Que qui foi?
-Ocê tá falan'u errad'u. O cert'u é PEGA-O.
Foi terrível. Senti saudade de casa. Senti saudade de minha mãe. Ela me ensinou as primeiras palavras do Português, a língua que seria meu espelho do mundo. Era tão gostoso: "Minin'u, vai drumi. Lembra di rezá".
Desde aquele dia, tenho que manejar duas Línguas Portuguesas. Uma na rua, outra no banco. Uma na sala, outra na cozinha. Sei que as duas são irmâs uterinas. Mas são irmãs preconceituosas. Uma exclui o espaço da outra. A que serve pra andar na mata não serve pra requerer aposentadoria. Embora as duas irmãs usem o mesmo sutiâ. A mesma calcinha. As mesmas "intimidades".

Será que não poderíamos ter uma só para todos no Brasil?

(Altair Malacarne)


Língua
(Caetano Veloso)

Gosto de sentir a minha lígua roçar
A língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar
A criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesias está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior
E deixa os portugais morrerem à míngua
"Minha pátria é minha língua"
Fala mangueira!
Fala!
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Vamos atentar para a sintaxe dos paulistas
E o falso inglês relax dos surfistas
Sejamos imperialistas
Vamos na velô da dicção choo choo de
Carmen Miranda
E que o Chico Buarque de Holanda nos resgate
E - xeque-mate - explique-nos Luanda
Ouçamos com atenção os deles e os delas da
TV Globo
Sejamos o lobo do lobo do homen
Adoro nomes
Nomes em Ã
De coisas como Rã e Imã
Nomes de nomes
Como Scarlet Moon Chevalier
Glauco Matoso e Arrigo Barnabé e Maria da
Fé e Arrigo Barnabé
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Se você tem uma idéia incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Blitz quer dizer corísco
Hollyood quer dizer Azevedo
E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o
Recôncavo
Meu medo!
A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria: tenho mátria
E quero frátria
Poesia concreta e prosa caótica
Ótica futura
Samba -rap, chic-left com banana
Será que ela está no Pão de Açúcar?
Tá craude brô você e tu lhe amo
Qué queu te faço, nego?
Bote ligeiro
Nós canto-falamos como que inveja negros
Que sofrem horrores no gueto do Harlem
Lívros, discos, vídeos à mancheia
E deixe que digam, que pensem e que falem


6.5.07

Os olhos do Fagner

Ok, ok, tudo bem. Podem até vir me dizer que o cara já está meio caidinho, meio passado e coisa e tal. E podem até mesmo me censurar e dizer que essa história de ficar admirando os olhos de outro homem é coisa de viado... (há muito tempo que já deixei de me importar com o que pensam ou deixam de pensar de mim, sobretudo quando a questão é a sexualidade)... Mas uma coisa ninguém pode negar: os olhos do Fagner, desde quando ele era bem novinho - como no vídeo aí abaixo - até os dias de hoje, têm uma coisa qualquer que magnetiza, que emociona, que encanta. E esse eterno jeitinho dele de nordestino do "último pau de arara", sempre com essa aparência frágil e franzina, parece que nos cativa à primeira vista. Obviamente que, como todo nordestino, há também - por trás de toda essa aparência de fragilidade - os sulcos e traços do rosto que denotam toda a força desse nosso povo sofrido (ainda que ele particularmente possa até não ter sofrido as agruras dos retirantes da seca). De qualquer maneira, quando o vejo em fotos ou em vídeos, consigo perceber essa harmonia perfeita da fragilidade e da força. E, convenhamos - pelo menos neste vídeo aqui - ele tem, sei lá, um quê de Bruce Lee e de Che Guevara, não?
O fato é que, muito embora ele tenha descambado para o filão mais romântico-brega nos últimos trabalhos, eu gosto muito do Fagner. Foi um artista de extrema importância na minha adolescência e juventude...

Quando penso em você, fecho os olhos de saudade... Ave, Fagner!


CANTEIROS
(Composição: Fagner / sobre poema de Cecília Meireles)

Quando penso em você fecho os olhos de saudade
Tenho tido muita coisa, menos a felicidade
Correm os meus dedos longos em versos tristes que invento
Nem aquilo a que me entrego já me traz contentamento
Pode ser até manhã, cedo claro feito dia
Mas nada do que me dizem me faz sentir alegria
Eu só queria ter no mato um gosto de framboesa
Prá correr entre os canteiros e esconder minha tristeza
Que eu ainda sou bem moço prá tanta tristeza
E deixemos de coisa, cuidemos da vida,
Pois se não chega a morte ou coisa parecida
E nos arrasta moço sem ter visto a vida.



5.5.07

Sobre homens e mulheres

Possivelmente estarei incorrendo no maior mico da minha vida ao me debruçar sobre esse tema. Mas hoje tive uma experiência nada agradável ao atender o pedido de uma grande amiga para ingressar numa comunidade do orkut. E por conta disso senti a necessidade de escrever. Sou assim: incomodou, eu escrevo.


A proposta da comunidade seria justamente discutir o velho e eterno embate entre homens e mulheres -como se isso fizesse algum sentido. No meu parco entender das coisas, homens são homens e mulheres são mulheres. E pronto. Isso deveria bastar, não? Por que tentar buscar diferenças quando estamos falando, em última instância, de pessoas? E pessoas são, antes de qualquer coisa, sentimentos. Bons ou ruins, nobres ou vis, simples ou complexos, mas sentimentos, porra! E então me vi lá nessa comunidade cercado pela torpeza maior que pode assolar o ser humano: a dificuldade para o afeto puro e simples. Era um desfile absurdo de nicks estranhos desfiando um amontoado de asneiras que me irritava profundamente: tinha um tal de “LordKazzado”, tinha um tal de “1 Brasa Mora”, tinha até mesmo um tal de “Lex Luthor” (e o Super-Homem, caramba? e o verão como apogeu da primavera, cadê?). E as comunidades em que essas figuras grotescas estavam inscritas!!!! Misoginia digna de tratamento psiquiátrico, caso grave mesmo, para internação e camisa de força... Só para se ter uma idéia, um dos nicks criativos aí citados parece ter percorrido todo o orkut atrás de comunidades que tratam a mulher como lixo: “Mulé é bicho burro mermo”, “São tudo umas vagabunda”, “Amigo de mulher é cabeleireiro”, "Elas preferem os canalhas", e por aí vai... Antes que eu tivesse que fazer uso de toda a minha cartela de Plasil, eu pulei fora da tal comunidade da minha amiga. Não sem antes expressar todo o meu incômodo com tamanho pensamento torto. Então, a anta neanderthalesca das comunidades aí citadas ainda veio com um discursozinho babaca, mal embasado, pobre e ortograficamente mal escrito sobre a minha “visão limitada acerca da hipocrisia da nossa atual sociedade, principalmente quando se refere às mulheres que se colocam num altar acima do bem e do mal, continuando-se a fazer vistas grossas perante o comportamento fútil das mesmas”... Puta que pariu! Tenho alunos da 8ª série que conseguem produzir textos mais densos que isso, na boa!


Com todo o respeito e carinho que tenho por essa minha amiga, mas criar uma comunidade para discutir diferenças entre homens e mulheres requer uma mais bem elaborada lista de convidados e uma maior seletividade de cabeças pensantes. Senão, corre-se o risco de cair na discussão do sexo dos anjos... feita por sexólogos de mesa de bar...


Quando nos propomos a pensar na diferença sexual, a primeira pergunta que se impõe é a mais elementar: por que a raça humana está dividida em homens e mulheres? Se não sabemos responder a esta pergunta, dificilmente poderemos saber em que consiste ser homem ou mulher, dificilmente poderemos entender como têm de ser as relações entre eles.

Nós, homens e mulheres, temos muitas coisas em comum: a dignidade humana, a inteligência, a capacidade de iniciativa, a responsabilidade, a necessidade de afeto, carinho, segurança e, por que não, de sexo também. No essencial, temos uma mesma natureza, que adquire matizes diferentes segundo se expresse em masculino ou em feminino. Temos quase tudo em comum. Onde reside a diferença sexual??? A única resposta possível e convincente repousa no campo da fisiologia: a necessidade de gerar filhos. Se não fosse necessário ter filhos, as pessoas não se dividiriam em homens e mulheres. Ou então as relações de amor e sexo entre homens e mulheres seriam distintas das que são agora. No entanto, se existe o amor e o sexo entre homem e mulher, é porque existem homens e mulheres. E isto leva-nos a considerar que aquilo que é específico e diferenciador do homem é ser um possível pai, e aquilo que é específico e diferenciador da mulher é ser uma possível mãe. O resto é comum a homens e mulheres. E ponto.


Não satisfeito com o leque de asneiras desfiado, o mesmo babaca do nick e das comunidades sui generis acima citado ainda me sai com essa pérola sobre a “Ame e dê vexame”, comunidade que tenho no orkut: “E sua comunidade ADV é rídicula cara. Não passa de um incentivo a bajulação, tornando os homens cada vez mais capachos das mulheres. Se declare para a sua amada e se jogue no chão pra que ela limpe os pés nas suas costas”... Muito provavelmente esse rapaz tem algum problema sexual grave, algo talvez que lhe ocasiona uma distensão traumática da região retofuricular. Eu aconselharia o coitado a procurar o doutor Agamenon, psicoprocotologista de renome, para cuidar do seu caso, pois “este tipo de distensão, se não tratada a tempo, pode se agravar e resultar numa ruptura dos ligamentos e desabamento da prega-rainha, estrutura nervimuscular que dá sustentação ao pavilhão lombo-retofuricular do indivíduo diletante”, palavras desse renomado profissional... hehehehehe


Mas voltando à seriedade necessária à discussão, lamento que esse indivíduo possua essa tão arraigada dificuldade para se declarar a sua amada. É um infeliz que vai viver constantemente um embate. Mas não embate entre homens e mulheres, e sim o embate entre ele e ele mesmo, coitado. Tenho plena consciência que o pequeno parvo nunca virá até aqui ler este texto, mas deixo aqui dois exemplos de homem e mulher que souberam magnificamente levar ao extremo a bajulação ao sexo oposto, numa linda declaração associada ao ato de homem e mulher deporem as armas um diante do outro... E eu assinaria embaixo os dois textos!!!!




Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor.

(...)

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor.


(Vinícius de Moraes)




Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver !
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida !


Não vejo nada assim enlouquecida ...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida !


"Tudo no mundo é frágil, tudo passa ..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim !


E, olhos postos em ti, digo de rastros :
"Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus : Princípio e Fim !
..."


(Florbela Espanca)

4.5.07

Traduzir-se

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas,
que já têm a forma do nosso corpo,

e esquecer os nossos caminhos, que levam sempre aos mesmos lugares.
É o tempo da travessia... e, se não ousarmos fazê-la,
teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."
(Fernando Pessoa)



Escrever é traduzir-se... é transcender. O ato de traduzir-me e retraduzir-me é o que me conduz aos meus muitos acessos... e excessos...

Talvez num futuro distante algum filólogo venha a se debruçar sobre meus papéis e, numa tentativa de exegese, consiga juntar minha língua de partida à minha língua de chegada e de mim faça algum sentido. Aí então, caros leitores, vou me juntar a vocês num café de uma livraria, de um cine-clube qualquer e vou finalmente me ler... Que já será tempo de algum entendimento, meu Deus! Porque neste exato momento, meus caros, sou travessia das mais arriscadas (quase o pessach hebraico, no sentido primeiro e real do termo). E a outra margem ainda vai longe... E como desencarnado provavelmente já estarei no tempo do entendimento, me será até mais confortável e poderão mesmo reclamar para mim alguma isenção de culpa, já que "traduttori tradittori".

Enquanto isso, eu busco traduzir-me.



Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?

(Traduzir-se. Ferreira Gullar)



"Quem elegeu a busca, não pode recusar a travessia."
(Guimarães Rosa)

3.5.07

A hora do sim é um descuido do não...

A francesada tem um verbinho apropriado para definir essa sensação que venho tendo há alguns dias: hanter [obcecar, perseguir]... Bem, eu poderia usar um verbo em português, mas acho que o verbinho francês tem a força expressiva necessária para essa minha sensação (e também porque eu sou fresco mesmo e em francês fica mais chique, oras!). O fato é que a frase que encabeça essa postagem “me hante” nesses dias.

Antes, é preciso que eu diga que tive que me afastar por um tempo do mundinho virtual: problemas de conexão. E também por conta da minha última postagem, que foi meio que uma sessão de análise daquelas que deixam a gente fora de combate por algum tempo. Por mais que eu não tenha medo de me expor aqui, mas acho que ali eu meio que passei um pouco do ponto. Andaram até mesmo dizendo que eu havia pirado o cabeção na Nouvelle Vague e nos filmes de Godard. De qualquer maneira, faço aqui meu mea culpa: chamar a felicidade daqueles nomes feios todos!!! Nada a ver, tadinha... Dona Felicidade já é uma senhora e, ainda que puta – cá pra nós – merece nosso respeito. Não se escarnece assim impunemente alguém tão importante. E, além do mais, meu frágil desdém só fez foi ressaltar meu primarismo e inabilidade para lidar com minhas limitações. Essa é que é a verdade, por mais que me custe admitir isso. Discernimento nunca foi uma qualidade da qual eu pudesse me vangloriar mesmo...

E aí veio essa música do Vinícius & Toquinho, sobretudo o verso acima citado, a ricochetear na minha cabeça nesses últimos dias... e tanta coisa aconteceu nesse tempo!!! E essa tanta coisa me levou a lançar alguns “sim” quando na verdade o “não” seria o correto. Obviamente que alguns desses “sim” são revogáveis e reversíveis. Mas também é fato que mesmo um “sim” revogado, ainda que usurpador de um “não”, deixa sempre sua marca indelével por anda passa... E isso é que é foda, meus amigos!

No fundo, a vida tem o dom de me surpreender quase sempre. Não tenho muito do que me queixar, sinceramente. Coisas boas sempre aconteceram para mim com certa freqüência... e as ruins - inevitáveis que são – se eu parar pra pensar, têm grande participação minha. Tenho muita sorte com as pessoas, isso é fato. Quem sabe por ser um tanto quanto seletivo (ou por pura sorte mesmo), sempre cruzo com pessoas fantásticas. E mesmo as ruins – não menos inevitáveis – servem, de certa forma, para me fazer lembrar das boas, me mostrar o rumo do bem. E, por isso, sou grato a elas também.

É bem provável que alguns amigos estejam certos: eu não sou tão idiota quanto penso. Talvez o que acontece é que eu seja bonzinho demais. E algumas pessoas não querem isso. Tem gente que gosta mesmo é de ser maltratado (não é o meu caso). O fato é que isso sempre atraiu coisas boas pra mim, ainda bem! Não faço questão sempre da verdade, da fidelidade... mas da lealdade e da ética eu não abro mão. Sou pelo jogo limpo. Sempre. Não importa em qual tipo de relação. Não que eu faça questão de gente boazinha o tempo todo. Uma certa malícia é até mesmo necessária, mas a leviandade não. Não quero nem vou fazer parte de nada onde as regras não estejam muito claras para mim e para o outro. Cartas na mesa. SEMPRE. Até mesmo os erros devem ser cometidos conscientemente: isso é o que eu chamo de liberdade. A vida já é bastante complicada, tudo bem... mas até mesmo para a diversão é preciso confiança. Senão não rola... na boa. Vira livre arbítrio desperdiçado. Sendo assim, não vou mais desperdiçar nem um “sim”, tampouco nenhum “não”.

Talvez por isso eu tenha tão levianamente escrachado a felicidade na postagem anterior. Por não ter percebido quanto de “sim” andei distribuindo por faltar coragem para o “não” ("Par délicatesse j'ai perdu ma vie", disse Rimbaud). Aí realmente ela, a felicidade, desconfia de mim e pica a mula. Confiança, lembra? Aí só cabe então se questionar como o Maiakóvsky, quando ele brada poeticamente: “E então, que quereis?...” E ele mesmo responde: “Não estamos alegres, é certo, mas também por que razão haveríamos de ficar tristes?” Tentarei prestar mais atenção aos meus “sim” e aos meus “não” de agora em diante. Já é hora de eu tentar crescer um pouco, não acham? Parar um pouco de culpabilizar a vida como algo exterior a mim e me tocar que a parte que me cabe por meus atos me será cobrada na apresentação da conta... e aí, meus caros, pode-se até questionar a cobrança dos 10% e do couvert artístico que nem aconteceu - mas daí a querer dar calote... nem pensar. É como disse o poetinha: se a vida é uma grande ilusão, não sei... só sei que ela está com a razão.

Sei Lá... A Vida Tem Sempre Razão
(Vinícius & Toquinho)

Tem dias que eu fico
Pensando na vida
E sinceramente
Não vejo saída
Como é, por exemplo
Que dá pra entender
A gente mal nasce
Começa a morrer
Depois da chegada
Vem sempre a partida
Porque não há nada
Sem separação

Sei lá, sei lá
A vida é uma grande ilusão
Sei lá, sei lá
Só sei que ela está com a razão

Ninguém nunca sabe
Que males se apronta
Fazendo de conta
Fingindo esquecer
Que nada renasce
Antes que se acabe
E o sol que desponta
Tem que anoitecer
De nada adianta
Ficar-se de fora
A hora do sim
É um descuido do não

Sei lá, sei lá
Só sei que é preciso paixão
Sei lá, sei lá
A vida tem sempre razão

Sei lá
Sei não

14.4.07

Existirmos: a que será que se destina? Parem a Stultifera Navis que eu quero descer!!!!!!!


Pode parecer loucura (e, se parece, certamente o é), mas a impressão que tenho (aliás, eu não a tenho, ela me tem... me persegue até) é a de que estou apenas ensaiando para a grande estréia do meu momento de felicidade. Só que o puto do diretor não estabeleceu nem a bat-hora nem o bat-local da mise-en-scène. Enquanto isso, essa tal de felicidade está por aí, feito uma puta qualquer pelos trottoirs e parques da vida, se entregando a todos, vadia e rameira como sempre; e eu aqui vou pegando uns pedaços de texto aqui e ali (sem rubricas do autor) e me viro com as marcações que eu mesmo crio, apesar da fraca memória.
No mais das vezes, conseguindo disfarçar minha inerente veia canastrona, faço do ensaio o espetáculo. Mas é terrivelmente foda que antes mesmo de cair o pano já foi a minha máscara que caiu. E dá-lhe ovos e tomates!!!! Mas aí me lembro que é só ensaio (e esse puto do diretor que não marca essa data!!!), e continuo na espera do grand finale. Sempre esperando, sempre ensaiando (pra quê, meu Deus?) e sempre me perguntando... Quando, onde, como, quando, onde,como... é agora? tá na hora? é agora que eu entro?... E essa dúvida parece ser o leitmotiv das minhas inquietações (que algum louco mais louco que eu poderia até mesmo confundir com traço trágico-poético). Sinceramente não me lembro de quando nem onde pela primeira vez essa dúvida mal elaborada se insurgiu contra as minhas certezas, mas posso afirmar que ela nada mudou no destino da humanidade... E nem vai mudar, se querem saber. Sou eu comigo mesmo e a minha dúvida: - Quando, meu Deus, quando a Felicidade vai chegar?
E há tempos ando assim, meio a esmo por esse emaranhado de ruas desconhecidas, sem gps, sem combustível e, como na música, "a corda quebra, o carro pára e o riacho fica fundo".... Só que eu tenho medo, ouviu?
E assim eu vou acordando de manhã em manhã, esperando que a felicidade tenha vindo bater a minha porta, ou quando muito deixado um recado. Mas a puta não manda nem um e-mail, nem telefona pra dizer "tô chegando, querido, só peguei um pouco de trânsito no caminho". Decididamente essa filha de uma égua chamada felicidade não está entre os meus contatos, nem é minha amiga no orkut. Ela está por aí (cachorrona, vaca, vadia), num dia de sol, céu azul sem nuvens, correndo, faceira e lépida. E sabem por quê? Porque a felicidade é saudável, é bonita, é malhada, corpo sarado e bronzeado. Aliás, os amigos dela, os que andam com ela pra cima e pra baixo, também o são. Eles, sortudos que são em tudo, não ficam sofrendo pelos cantos, nem chorando ausências, nem se escravizam a coisas em que não acreditam ou não merecem, e nem de longe pensaram algum dia que não merecem o que desejam. Eles são bons em tudo, os amigos dela.
Mas eu espero... sempre espero. Os nós dos dedos tamborilando no tampo da mesa, eu espero, paciente que sou. E fumo mais um cigarro, e mais um e mais um... e lá se vão um maço, dois maços, três maços... e metade do meu pulmão no cinzeiro.
É, meu velho Torquato, e o Caetano ainda te pergunta (tardiamente, é certo, mas pergunta): "Existirmos: a que será que se destina?"... Fosse eu, mudaria o verbo: a que será que se desatina... E eu faço o quê, meu velho, para parar de me sentir um maior abandonado?... O quê? Ah não, isso eu já tentei... O quê? Pra você deu certo? Mas porra, cara, você pelo menos escreveu um livro!! Eu nem isso ainda. E nem plantei uma árvore e nem tive um filho. Meus últimos dias seriam mais paupéria que os seus, pode acreditar... na boa.
Mas, voltando a falar da tal vagabunda da felicidade, teve um dia em que pensei tê-la visto me acenando e gritando lá da rua. Tava ela lá com os amiguinhos dela sortudos em tudo, fazendo um buzinaço do caralho de acordar toda a vizinhança, a mal-educada. E ainda gritava: "- Rápido, ô viado, vem aqui fora. Rápido que você já não está mais em idade de se fazer esperar!" E ainda me sacaneava, a escrota... O foda é que eu não sabia direito se devia ir ou não... E se não fosse mais ensaio? Será que eu estaria preparado? Será que já era o momento de encarar a platéia, de cara limpa, e dizer, como você disse, meu velho, num só ato, sem medo da dona Bárbara:

eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível
eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora
eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim
eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranqüilamente
todas as horas do fim


Caguei no pau, cara. Não fui. Ou fui, mas num passinho de bebê engatinhando. Quando cheguei, já era tarde. A puta já comia pneu na esquina e os amiguinhos sortudos em tudo gargalhavam da minha cara de pastel. Não era ensaio. Só que não prestei atenção ao terceiro sinal... Diretor mais filho da puta também que nem me avisou que era a hora!
Mas, cara, na boa, qualquer dia eu desisto desse ensaio insano, ponho fogo no figurino, arrebento o cenário a marretadas, rasgo os cartazes e o texto. Alopro de vez. Porque, mesmo que eu assim por um acaso da vida (é, dizem que eles ocorrem) estreasse finalmente, quem me garante que a crítica me seria favorável? Você sabe, né, dona Bárbara é foda! E quer saber? O outono já chegou aqui no Rio. Tá tudo assim meio cinza mesmo. O que é um pé no saco mesmo é essa certeza das horas que precedem a aurora, quando me dou conta que não haverá mais noite dormida... quando muito, mal dormida. São horas indubitavelmente de solidão. Mas uma merda de solidão cheia de ruídos e vozes entrecortadas que me dizem a todo momento, numa torrente pavorosa de avisos, recadinhos babacas e conselhos do tipo "eu te disse, eu te disse, eu te disse". Vou ficar, cara, na tua Navilouca... me acomodei à Stultifera Navis. Mas não vou pular na correnteza como você. Fica para uma outra hora, valeu? Vou tentar dormir um pouco agora... A berceuse já até escolhi.. Espero que você me perdoe a obviedade, mas não resisti...

Cajuína
(Caetano Veloso)

Existirmos: a que será que se destina?
Pois quando tu me deste a rosa pequenina
Vi que és um homem lindo e que se acaso a sina
Do menino infeliz não se nos ilumina
Tampouco turva-se a lágrima nordestina
Apenas a matéria vida era tão fina
E éramos olharmo-nos intacta retina
A cajuína cristalina em Teresina



Em tempo: A puta da minha felicidade, que eu pensava que tinha ido dar uma volta na esquina com os amiguinhos dela sortudos em tudo, me ligou dizendo que está na fronteira com a Nicarágua. Está esperando a balsa pra ver se consegue asilo político em Cuba. Pode? Piraaaaaaaanha!

13.4.07

Ainda há vida inteligente (e de bom gosto) no youtube

Pois é. Há.
Perambulando por lá, é bem verdade, a gente acha um amontoado de porcarias, de colagens mal-feitas, de vídeos caseiros que nos fazem querer repensar mesmo o sentido da palavra "amador"... E é um tal de homenagens pra cá e tributos pra lá que puta que pariu... é de doer as vistas e os ouvidos. Mas vá lá... com um pouquinho de paciência e muita garimpagem, a gente consegue descobrir coisas muito boas também. Nem tudo está perdido. HÁ VIDA INTELIGENTE NO YOUTUBE, AMIGOOOOOOOOSSSSSS!!!!!!!
Prova disso é esta pérola que achei por acaso: uma linda voz de,cuja dona chama-se Cristina Motta, cantando "Mais um adeus", de Vinícius e Toquinho. E mais: além de cantar e tocar um violão muito bem, ela ainda desenha!!!!!!!!! E é modesta a ponto de dizer: "Não sou desenhista nem tampouco uma exímia violonista. Mas acho que deu pra enganar..."

Então fica assim combinado: quem souber quem é Cristina Motta me avisa, ok? Quero dar um beijo nessa mulher... na boa.

Segue a letra da música abaixo e, em seguida, o vídeo.


Mais um adeus

(Vinicius de Moraes / Toquinho)

Mais um adeus
Uma separação
Outra vez, solidão
Outra vez, sofrimento
Mais um adeus
Que não pode esperar

O amor é uma agonia
Vem de noite, vai de dia
É uma alegria
E de repente
Uma vontade de chorar

Olha, benzinho, cuidado
Com o seu resfriado
Não pegue sereno
Não tome gelado
O gim é um veneno
Cuidado, benzinho
Não beba demais
Se guarde para mim
A ausência é um sofrimento
E se tiver um momento
Me escreva um carinho
E mande o dinheiro
Pro apartamento
Porque o vencimento
Não é como eu:
Não pode esperar

O amor é uma agonia
Vem de noite, vai de dia
É uma alegria
E de repente
Uma vontade de chorar




Agora, me digam: é lindo ou não é?

11.4.07

Sem medo das gentilezas do coração... Feito louco pelas ruas...

Há exatos 90 anos, no dia 11 de abril de 1917, nascia José Datrino, o "amansador dos burros homens da cidade que não tinham esclarecimento", ou simplesmente o Gentileza. Anos depois, no dia 17 de dezembro de 1961, na cidade de Niterói, houve um grande incêndio no circo Gran Circus Norte-Americano, o que foi considerado uma das maiores tragédias circenses do mundo. Neste incêndio morreram mais de 500 pessoas, a maioria, crianças. Na antevéspera do Natal, seis dias após o acontecimento, José acordou alegando ter ouvido "vozes astrais", segundo suas próprias palavras, que o mandavam abandonar o mundo material e se dedicar apenas ao mundo espiritual. Pegou um de seus caminhões e foi para o local do incêndio. Plantou jardim e horta sobre as cinzas do circo em Niterói. Aquela foi sua morada por quatro anos. Lá, José Datrino incutiu nas pessoas o real sentido das palavras Agradecido e Gentileza. Foi um consolador voluntário, que confortou os familiares das vítimas da tragédia com suas palavras de bondade. Daquele dia em diante, passou a se chamar "José Agradecido", ou simplesmente "Profeta Gentileza".
Após deixar o local que foi denominado "Paraíso Gentileza", ele começou a sua jornada como personagem andarilho. A partir de 1970, percorreu toda a cidade. Era visto em ruas, praças, nas barcas da travessia entre as cidades do Rio de Janeiro e Niterói, em trens e ônibus, fazendo sua pregação e levando palavras de amor, bondade e respeito pelo próximo e pela natureza a todos que cruzassem seu caminho. Aos que o chamavam de louco, ele respondia: - "Sou maluco para te amar e louco para te salvar".
A partir de 1980, escolheu 56 pilastras do Viaduto do Caju que vai do Cemitério do Caju até a Rodoviária Novo Rio, numa extensão de aproximadamente 1,5km. Ele encheu as pilastras do viaduto com inscrições em verde-amarelo, propondo sua crítica do mundo e sua alternativa ao mal-estar da civilização. Durante a ECO-92, colocava-se estrategicamente no lugar por onde passavam os representantes dos povos e incitava-os a viverem a gentileza e a aplicarem gentileza em toda a Terra. Seu lema: "Gentileza gera gentileza."

Nesses tempos estranhos, de sentimentos estranhos, de atitudes estranhas, pode soar estranho um sujeito estranho numa túnica estranha, de cabelo estranho falando de uma coisa tão estranha quanto gentileza. Estranhos, entretanto, somos nós que fazemos desse estranhamento a regra, e não a exceção. Estranhos somos todos nós para os outros. Estranhos são todos os outros para nós. E assim vamos nos estranhando, nos desconhecendo, nos perdendo nas terras estranhas do nosso dia-a-dia, estabelecendo as fronteiras do nosso metro quadrado diário, exigindo passaporte e visa de quem nele ousa penetrar. Estranho e equívoco é o contato esboçado e não realizado, é a palavra ensaiada mas reprimida... De qualquer maneira, não sei se a estranheza do mundo tem jeito. Nós temos. O pronome "nós", nesse mundo estranho, compreende, quando muito, o núcleo familiar. Como esperar, então, que haja gentileza para com o outro, se o pronome "nós" não consegue nem perceber o outro? Aí então, deixa de ser um pronome para virar um substantivo plural. Substantivo esse cada vez mais difícil de se desatar... e daí todo o estranhamento. Proponho, como forma de anular tal estranhamento, a palavra franca, o toque, o abraço... O que me fez lembrar do meu amigo Othoni que, na comunidade Ame e dê vexame, faz um jogo de palavras com "abraços" e "há braços"... Ao que eu respondi:

Há braços. Há pernas. Há bocas. Há olhos. Há nervos e músculos e sangue e suores e sêmen. Há de certo sentimentos. Há palavras a traduzi-los. Há equívocos a interpretá-las. Há dores, portanto...
Há dias sim, há dias não... Adias o quê no coração?


Há braços, há todos!




Feito louco
Pelas ruas
Com sua fé
Gentileza
O profeta
E as palavras
Calmamente
Semeando
O amor
À vida
Aos humanos
Bichos
Plantas
Terra
Terra nossa mãe.

Nem tudo acontecido
De modo que se possa dizer
Nada presta
Nada presta
Nem todos derrotados
De modo que não dê pra se fazer
Uma festa
Uma festa.

Encontrar
Perceber
Se olhar
Se entender
Se chegar
Se abraçar
E beijar
E amar
Sem medo
Insegurança
Medo do futuro
Sem medo
Solidão
Medo da mudança
Sem medo da vida
Sem medo
Das gentileza
Do coração.

Feito louco pelas ruas...

(Gonzaguinha)
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